Na matéria anterior abordamos algumas transformações que acompanharam a promulgação da Constituição Federal de 1988. Desde a redemocratização, uma das principais mudanças envolveu o papel dos municípios no cenário nacional.
Nesta matéria, vamos entender o processo de descentralização nas cidades e quais são as principais questões orçamentárias do poder público municipal. Confira:
Essa matéria faz parte de uma trilha de conteúdos sobre a Gestão Pública e também um dos pilares de aprendizado em nossa pós-graduação Master em Liderança e Gestão Pública (MLG).
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O SISTEMA FEDERATIVO
Que o Brasil é um país populoso, extenso e complexo todos nós sabemos. Desse modo, administrar este vasto território não é uma tarefa simples. O sistema federativo é um formato de organização e divisão político-administrativa do território nacional que tem como objetivo facilitar seu governo. O Brasil é dividido em 27 unidades federativas (26 estados mais o Distrito Federal) e todas elas são unidades subnacionais que formam a União.
O sistema federativo brasileiro compreende a União, estados, Distrito Federal e os municípios. Todas essas instâncias possuem certo grau de autonomia para organizar sua própria gestão, legislação e arrecadação. O importante é compreender que essas instâncias estão subordinadas a unidade maior que corresponde ao Estado brasileiro e a Constituição Federal (1988).
Ao longo da história brasileira, desde a Proclamação da República em 1989, o Brasil passou por governos mais ou menos centralizados dentro de seu sistema federativo. A República Velha, alguns períodos autoritários da Era Vargas e o Regime Militar de 1964 foram marcados por momentos de centralização política e econômica no país. A redemocratização, celebrada na Constituição Federal de 1988, exigiu uma mudança política que fortalecesse financeiramente e politicamente os estados e municípios. Desde então a federação brasileira é guiada pelo complexo processo de descentralização.
OS MUNICÍPIOS BRASILEIROS
De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Brasil possui atualmente 5.570 municípios. Dentro do sistema federativo, estes municípios possuem considerável autonomia para realizar sua gestão pública e executar as políticas públicas determinadas pelo Governo Federal e pelo Governo Estadual.
Municipalização
O projeto de descentralização da federação brasileira é complexo. Nesse sentido, o principal desafio desse processo é a conciliação entre o avanço da descentralização e a redução das desigualdades regionais.
A CF/88, fortalecendo a autonomia dos municípios – ao torná-los entes federativos – e garantindo as transferências de recursos do governo federal para estados e municípios (fundos de participação) permitiu uma tendência à municipalização. Ou seja, a proliferação de novos municípios.
Além disso, a perspectiva de municipalização trata da execução das políticas públicas a nível subnacional, mais próxima da população. Se levarmos em consideração que a população possui mais proximidade com a gestão local (Prefeitura) do que com a gestão federal (Presidência da República), é importante que as políticas públicas sejam executadas com maior qualidade, levando em consideração as especificidades de cada micro-região do Brasil.
O SUS (Sistema Único de Saúde), por exemplo, é uma ótima forma de visualizarmos essa questão na prática. Trata-se de uma política federal (elaborada para todo o território nacional), mas a execução cabe aos estados e municípios, levando em consideração sua autonomia gerencial. Portanto, colocar o SUS em prática é uma tarefa dos municípios, que melhor pode definir em qual local deve ser construída uma Unidade Básica de Saúde, qual o formato da participação popular na execução da política (Conselhos de Saúde), etc.
Mas, para exercer a governabilidade dentro das normas constitucionais, os municípios brasileiros precisam adequar seu planejamento às Leis Orçamentárias. Parte considerável dos municípios cumprem o que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal (nº101/2000), mas ainda se trata de um grande desafio para os municípios de pequeno porte por falta de um aparato técnico gerencial que consiga organizar o planejamento financeiro dos governos.
Para compreender melhor do que se trata essas Leis Orçamentárias e como elas impactam na gestão das políticas públicas, vamos apresentar abaixo o funcionamento e qual a finalidade do Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Orçamentárias, Lei Orçamentária Anual e do Plano Diretor.
1) Plano Plurianual (PPA)
O Plano Plurianual é um instrumento fundamental para a boa gestão pública. Ele funciona como planejamento de médio prazo e é realizado através de uma lei. Seu conteúdo se refere às prioridades para o período de quatro anos de governo – inicia-se no segundo ano da gestão e termina no primeiro ano de cada novo governo. Desta forma é possível garantir a continuidade administrativa, fazendo com o que os gestores públicos possam avaliar e reutilizar determinados aspectos do Plano anterior.
2) Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)
A LDO estabelece quais serão as metas e prioridades do exercício financeiro do ano seguinte. Ou seja, a Lei vai definir os parâmetros da alocação/distribuição dos recursos no orçamento anual levando em consideração tudo aquilo que foi inserido como objetivos e metas do Plano Plurianual. Isso faz com que a LDO seja primordial na adequação das ações do governo em relação às possibilidades dos recursos públicos disponíveis.
3) Lei Orçamentária Anual (LOA)
A LOA define qual será o orçamento do governo em cada ano levando em consideração uma estimativa das receitas e as despesas fixas. O poder Legislativo é responsável por avaliar e ajustar a proposta de orçamento feita pelo Executivo, levando em consideração as Diretrizes Orçamentárias e o Plano Plurianual. O acompanhamento da LOA garante a transparência das contas públicas e o controle da correta aplicação dos recursos públicos.
4) Plano Diretor
O Plano Diretor está atrelado ao projeto urbano do desenvolvimento das cidades. O Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001), levando em consideração a Constituição Federal de 1988, determina as normas que organizam os interesses sociais no que diz respeito ao uso da propriedade urbana, levando em consideração os interesses coletivos, a segurança dos cidadãos e cidadãs e o equilíbrio ambiental.
A CF/88 determina a função social da propriedade urbana, seja pública ou privada e, a partir do contexto dos direitos à moradia, terra, saneamento básico, transporte e lazer, o Plano Diretor se constitui como principal ferramenta do planejamento urbano. A proposta é que ele seja debatido coletivamente (Estado + sociedade civil) a partir dos temas “economia”, “meio ambiente”, “interesses sociais”, “bem-estar social”.
Além disso, é importante notar que a realização do Plano Diretor é obrigatória para municípios com mais de 20 mil habitantes.
Para exemplificar melhor o processo das Leis Orçamentárias, abaixo há um esquema inspirado no programa Orçamento Fácil do Senado Federal. Neste caso vamos levar em consideração os prazos do governo federal já que os prazos municipais são variados – cada município estabelece as data limites na própria Lei Orgânica do Município:
Como podemos observar, a execução das políticas públicas do país está diretamente relacionada ao sistema federativo brasileiro. Dentro de uma perspectiva política, os municípios saíram fortalecidos da Constituição Federal de 1988 a partir da proposta de descentralização de poder. Se por um lado os municípios ganharam autonomia para gerir a política local, por outro também ganharam a responsabilidade de organizar a execução das políticas públicas levando em consideração as Leis Orçamentárias.
É fundamental que as gestões municipais se apropriem das normas organizadas na Constituição Federal de 1988 e na Lei de Responsabilidade Fiscal de 2000 a fim de qualificarem positivamente a administração pública. Deste modo, portanto, são favorecidos os interesses de seus cidadãos e cidadãs.