Introdução
O saneamento básico é uma questão fundamental para o bem-estar, saúde e desenvolvimento sustentável de qualquer país. No Brasil, essa preocupação ganhou novos contornos com a implementação do novo marco legal do saneamento básico, que completa sua aprovação há três anos. Ao consolidar mudanças significativas, o novo marco visa não apenas aumentar a oferta de serviços, mas também garantir que até 2033, uma enorme parcela da população brasileira tenha acesso a serviços essenciais de abastecimento de água e tratamento de esgoto.
No entanto, os desafios associados ao financiamento desses serviços não são pequenos. Historicamente apoiado por recursos públicos, principalmente federais, o setor de saneamento tem enfrentado crescentes necessidades de investimento, que muitas vezes ultrapassam a capacidade do setor público. A participação do investimento privado, assim como da cooperação internacional, torna-se essencial para suplementar esses recursos. Além disso, é imperativo buscar maior eficiência, transparência e inovação na alocação e uso desses recursos. O investimento privado, embora promissor em termos de eficiência e inovação, deve ser acompanhado de regulamentação robusta, garantindo o acesso universal aos serviços.
Com a aprovação do novo Marco Legal em 2020, houve um comprometimento significativo de recursos para melhorar os serviços de saneamento, com R$ 90 bilhões garantidos até o final de 2022, beneficiando mais de 225 cidades brasileiras. Contudo, a trajetória de melhoria ainda depende de uma coordenação eficaz entre os diferentes níveis de governo, investimentos contínuos e uma regulamentação rigorosa e eficaz. A substituição de decretos anteriores e a introdução de novos regulamentos visam facilitar este processo, fornecendo um caminho mais claro para a realização dos objetivos estabelecidos pelo novo marco.
Os principais avanços do novo marco legal do saneamento básico no Brasil são:
1. Definição de metas para universalização dos serviços;
2. Aumento da concorrência pelo mercado com vedação a novos Contratos de Programa;
3. Maior segurança jurídica para processos de desestatização de companhias estatais;
4. Estímulo à prestação regionalizada dos serviços; e
5. Criação de um papel de destaque para a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) na regulação dos serviços.
Além disso, o novo marco legal do saneamento básico consolida mudanças significativas no quadro institucional do setor visando aumentar a oferta do serviço para uma gama maior da população. Desde sua aprovação, os contratos de saneamento devem estabelecer uma meta de atendimento de 99% da população em abastecimento de água e 90% da população em coleta e tratamento de esgotos até 2033.
O financiamento dos investimentos em saneamento básico
O financiamento é um desafio fundamental para o setor de saneamento, pois requer investimentos significativos em infraestrutura e serviços. As fontes incluem recursos públicos, investimento privado e cooperação internacional. Historicamente, a principal fonte de financiamento dos serviços de saneamento básico tem sido os recursos públicos, principalmente do governo federal. No entanto, estes por si só não são suficientes para atender às necessidades de financiamento do setor, de modo que o investimento privado e a cooperação internacional também são importantes fontes de financiamento ao longo do tempo. Destaca-se ainda a necessidade de maior eficiência e transparência na utilização dos recursos, bem como a necessidade de mecanismos de financiamento mais inovadores, como títulos verdes e títulos de impacto social.
Os potenciais benefícios do investimento privado são maior eficiência e inovação, mas também há necessidade de regulamentação efetiva para garantir que este não comprometa o acesso universal aos serviços de saneamento básico. De modo geral, há clara necessidade de uma estratégia de financiamento diversificada e sustentável para tais serviços no Brasil, para que se inclua uma combinação de recursos públicos, investimentos privados e cooperação internacional.
O novo marco legal dos serviços de saneamento básico, nesse sentido, proporciona um ambiente mais favorável para investimentos privados e parcerias público-privadas. No entanto, há muitos desafios a serem enfrentados, como a necessidade de maior coordenação entre os diferentes níveis de governo, a necessidade de mais investimentos em infraestrutura e a necessidade de regulamentação mais efetiva do setor.
Com a sanção do novo Marco Legal do Saneamento, em 2020, cerca de R$ 90 bilhões – em investimentos e outorgas – foram assegurados até o final de 2022, por meio de concessões para implantar, ampliar ou aperfeiçoar os serviços em mais de 225 cidades. Os Gráficos abaixo mostram que houve considerável expansão tanto do atendimento de água canalizada quanto de esgoto pela rede geral, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), realizada pelo IBGE.
Fonte: Elaboração própria com dados da PNADC. Obs: Os anos de 2020 e 2021 não tiveram tal edição devido às limitações impostas pela pandemia
Os novos decretos de saneamento
O governo federal substituiu dois polêmicos decretos anteriores com novos regulamentos para a nova lei de saneamento básico. Estes antigos decretos foram alvo de críticas por investidores privados e oposição política, levando à proposta de um projeto para anulá-los. Os novos decretos introduzem mudanças, incluindo a eliminação da opção de fornecimento direto de serviços de saneamento em certas regiões sem a necessidade de licitação, que antes permitia operações irregulares por empresas estaduais em várias capitais.
O prazo para as empresas de saneamento demonstrarem capacidade financeira para grandes investimentos no setor foi estendido até 31 de dezembro de 2023. Esta comprovação visa garantir que as empresas possam universalizar os serviços de água e esgoto até 2033, conforme estipulado pela lei. Inicialmente, o prazo era até o final de 2021, mas muitas empresas, especialmente no Norte e Nordeste, ainda não enviaram a documentação necessária, tornando suas operações tecnicamente irregulares. Os novos decretos oferecem uma “segunda chance” para regularizar essa situação.
O decreto esclarece que as empresas de saneamento devem demonstrar solidez financeira para cumprir suas obrigações, particularmente aquelas relativas à universalização dos serviços. Isso se aplica tanto a contratos já existentes quanto a novos contratos resultantes de licitações. No entanto, o decreto não se aplica a serviços prestados diretamente por municípios ou pelo Distrito Federal, seja através de empresas públicas ou de economia mista controladas por eles.
O texto também define termos essenciais para a interpretação do decreto. Entre eles, “auditor independente” refere-se a uma empresa registrada na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que pode verificar a precisão dos cálculos financeiros de uma empresa de serviços públicos. Outros termos notáveis incluem “certificador independente”, reconhecido pelo Inmetro, e “indicadores econômico-financeiros”, que ajudam a determinar a saúde financeira de uma empresa.
Para as empresas comprovarem sua capacidade financeira, devem primeiramente apresentar indicadores financeiros robustos, como lucro e níveis baixos de dívida. Se isso não for possível, devem submeter um plano de melhoria para os próximos cinco anos. Posteriormente, um plano de viabilidade, detalhando investimentos necessários, e um plano de captação de recursos são necessários. Empresas que não consigam cumprir esses requisitos individualmente podem optar por formar consórcios em estruturas regionalizadas.
Contratos de empresas que não demonstram capacidade financeira serão considerados irregulares. Se uma empresa de serviços públicos está sendo privatizada, é presumida sua capacidade financeira, desde que cumpra certas condições. Caso contrário, será considerada financeiramente incapaz, tornando a busca por parcerias na cidade operacional uma prioridade para um fundo federal. Decisões sobre situações não especificadas no decreto serão tomadas pelos órgãos reguladores, e empresas já avaliadas anteriormente podem escolher manter essa avaliação.
Por Daniel Duque, gerente de Inteligência Técnica do CLP