Para aprofundar a discussão sobre a realidade desses servidores estaduais, o CLP lançou a série Servidor – Os desafios de quem faz o serviço público acontecer, uma iniciativa de 3 episódios, cada um com foco nos servidores do Executivo de cada ente federativo, respectivamente: municípios, estados e federação.
No segundo episódio, que aconteceu nesta terça-feira (3), participaram Renata Vilhena, servidora de carreira com ampla experiência nos governos do Estado de Minas Gerais, e Fabrício Marques, presidente do CONSAD – o Conselho Nacional de Secretários de Estado da Administração e Secretário de Estado de Planejamento, Gestão e Patrimônio de Alagoas.
Abaixo, confira os destaques da conversa focada no âmbito estadual da administração pública. Assista na íntegra o segundo episódio da série Servidor – Os desafios de quem faz o serviço público acontecer:
Folha de pessoal pode levar estados ao colapso
Segundo estudo do CLP, o aumentos de salários de servidores estaduais em alguns estados brasileiros podem agravar uma situação fiscal já problemática. O levantamento mostra que 25 dos 27 estados devem comprometer mais de 60% da receita corrente líquida (RCL) com folha de pagamento por causa do efeito da pandemia na arrecadação.
“A base dessa crise econômica, que se iniciou em 2014, foi a queda na arrecadação dos estados e municípios. De forma estrutural, não tivemos incremento de receita pública, além de termos um cenário em que a folha de pagamento é a maior despesa dos entes”, explicou Fabrício Marques, presidente do CONSAD e Secretário de Estado de Planejamento, Gestão e Patrimônio de Alagoas.
Em estados como Rio Grande do Norte e Mato Grosso, os gastos do pessoal – sem a atualização do reajuste – já chegam a mais de 90% da receita. Quando esse patamar atingido, o estado muito próximo da insolvência fiscal e de parar a máquina administrativa, sem capacidade de implantar ou desenhar uma política pública nova.
2021 será um ano desafiador para os estados
Para Fabrício, a previsão é de um possível congelamento da atuação dos estados nos próximos anos. “Este ano já está sendo um ano difícil, mas o próximo será desafiador. O auxílio emergencial recebido pela população irá acabar e as demandas irão aumentar. Vamos precisar fazer mais com menos, e teremos que ser mais eficientes e criativos”, explicou.
“Essa grave crise nas finanças pode perdurar por um período muito longe”, afirmou. “É provável vermos alguns estados parando totalmente o funcionamento da máquina pública.”
Para o secretário, os estados precisam inovar. Ele cita o exemplo do Estado do Alagoas, onde foram realizados um importante trabalho tanto do ponto de vista da arrecadação, como da despesa com pessoal. “Tinha um espaço para realizar uma reforma Tributária, e o estado fez. Foi um dos poucos no Brasil que conseguiu ter uma arrecadação real”, explicou.
Além disso, Alagoas também implementou um conjunto de medidas para reduzir o número de servidores. Pagando todos os direitos e ressarcimentos dos funcionários, o estado demitiu os servidores celetistas e reduziu o número de servidores comissionados. “Também não concedemos aumento real aos servidores. Tudo isso permitiu ao estado ter uma boa condição na relação de despesa com pessoal e receita”, concluiu Fabrício.
Não há diálogo entre secretarias estaduais
Um dos principais desafios dos governos estaduais é a dificuldade de implementar projetos que envolvem diversas secretarias. Sem um plano para que elas se envolvam, há falta de comunicação e de compartilhamento de dados.
“As políticas públicas devem ser transversais. Não vamos diminuir a criminalidade, por exemplo, só com as forças policiais. Não vamos conseguir melhoria na segurança pública através de uma atuação vertical, precisamos trabalhar as várias políticas públicas em conjunto para conseguirmos os resultados que queremos”, afirmou Renata Vilhena, que já foi secretária estadual e tem grande experiência conduzindo processos de reforma da administração estadual nos governos do Estado de Minas Gerais entre 2003 – 2014.
Responsável por desenvolver um novo um novo desenho para a estrutura administrativa do Estado de Minas Gerais, Renata propôs maior clareza nas atribuições e desenhos organizacionais horizontalizados, para evitar a fragmentação de políticas setoriais e criar mecanismos de reforço para maior foco na elaboração e execução de políticas públicas.
“O líder tem o papel de promover esse engajamento de todos os colaboradores”, disse Renata. “No governo de Minas Gerais, o desdobramento das secretarias foi muito importante para colaborar nessa comunicação e entendimento do que cada equipe contribui no alcance dos resultados”.
A reforma Administrativa mineira
A administração do estado estava inchada, com sobreposição de atribuições e responsabilidades entre as Secretarias, e pouca clareza no papel de coordenação central do núcleo de governo. Após três meses de tramitação, a reforma mineira foi aprovada no início de maio, e as novas regras deverão gerar uma economia de quase R$ 1 bilhão em quatro anos de governo. Elas incluem a redução de 21 para 12 secretarias e o corte de cargos comissionados no Executivo.
“O diferencial para que a gente pudesse integrar todas essas políticas públicas foi essa estratégia clara. Com objetivos e metas bem contextualizados, um bom monitoramento, uma comunicação clara e efetiva, e reconhecimento de resultados”, explicou a servidora.
Reforma do governo ignora melhoria das carreiras públicas
Apesar de projetar uma economia de R$ 400 bilhões, segundo estudo do CLP, a reforma Administrativa anunciada pelo governo não abarca medidas que tratam da melhoria das carreiras públicas. Propostas para seleção, carreira, gestão de pessoas e avaliação ficarão para o conjunto de PLs que o governo ainda irá submeter ao Congresso.
Para Renata, a prioridade da reforma deve ser promover flexibilidade e capacidade para que a gestão consiga levar produtividade de forma sistêmica aos servidores. Além disso, é preciso valorizar, reconhecer e dar oportunidades aos funcionários públicos. “São essas pessoas que fazem acontecer, que transformam tudo o que vai para a sociedade”, afirmou.
Fabrício também entende que a discussão fiscal, apesar de importante, não deve ser prioritária. Assim como Renata, o secretário vê a necessidade de trazer instrumentos de flexibilidade para o gestor, possibilitando entregar muito mais à população.
“Não temos uma discussão muito focada neste tema, é preciso fazer uma grande mobilização pela causa da gestão de pessoas, fazer um debate contínuo em torno do que é importante termos para garantir condições de trabalho”, concluiu Fabrício. “É preciso fortalecer as capacitações, modernizar o processo de seleção e debater a profissionalização na gestão pública”.
Os 3 episódios da série SERVIDOR estão disponíveis no canal de Youtube do CLP. Assista.