O CLP conversou com Lucas Fernandes, que é consultor em gestão pública e políticas educacionais e tem passagem valiosa nos governos estaduais e federais. No bate-papo ele falou sobre as transferências dos governos focadas em educação e explicou como funciona o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb.
O fundo especial é formado principalmente por recursos provenientes dos impostos e transferências dos estados, Distrito Federal e municípios, vinculados à educação. Todo o recurso gerado é redistribuído para aplicação exclusiva na educação básica.
CLP – Quais são os principais desafios no dia a dia e até mesmo os erros cometidos pelos gestores públicos de educação quando falamos dos recursos voltados para essa pasta?
Acredito que o principal problema não é nem o recebimento em si, mas sim o uso e depois a prestação de contas. A primeira coisa é quando você tem itens que não poderiam ser pagos com esse recurso, como no caso de gestores que pegam o dinheiro do Fundeb e colocam, por exemplo, para a alimentação escolar, que é uma coisa que não pode.
O segundo ponto tem a ver com a prestação de contas, mecanismos de controle e acompanhamento. As escolas têm um problema muito grande com prestação de contas do programa Dinheiro Direto na Escola. Os municípios acabam reproduzindo o mesmo tipo de erro, por exemplo, com transporte e alimentação escolar, além de outros erros que são até mais graves como o de não ter instituído o Conselho de Acompanhamento do Fundeb.
Tudo isso pode gerar problemas para o município no recebimento de recursos, como ficar bloqueado para receber recursos de convênio ou perder a sua capacidade de gestão do recurso porque aplica numa fonte, não recebe e fica com as suas contas travadas, que é uma situação que nenhum gestor público deseja.
CLP – Que dica você dá para os gestores públicos para que eles não caiam nessa situação de ficar com as contas travadas?
Tem uma dica mais estratégica que é a de olhar para os recursos da educação pensando sempre em receita e despesa. O município vai ter uma previsão de receitas que é definida com regras muito claras, tirando as transferências voluntárias, de convênios e assim já consegue saber quanto ele vai receber do Fundeb, de transporte escolar, alimentação, salário educação, etc.
Com essas receitas o gestor tem que fazer o dever de casa de entender o quanto ele está gastando nas suas escolas ou para uma oferta de educação infantil ou de ensino fundamental e cruzar, sabendo o que ele está de fato gastando em relação ao que ele está recebendo, não só para ele priorizar as matrículas, mas para conseguir se planejar e saber quanto recurso o município vai ter que aportar do tesouro municipal.
Um segundo ponto, é se preparar para fazer a prestação de contas e a instrução dos processos para gasto, o que tem a ver com formação das equipes no nível da secretaria que possam dizer ao gestor do financiamento onde ele pode aplicar recursos do Fundeb, evitando problemas posteriores. E nas escolas preparar os gestores escolares para eles sempre saberem o que podem e o que não podem fazer com os recursos e mesmo como prestarão contas nesses dois itens.
Para isso, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) tem uma serie de manuais, materiais e cursos, inclusive online, que os gestores podem fazer. O custo benefício de dedicar um tempo para a capacitação dos seus profissionais acaba sendo muito positivo para que você não tenha problema na hora de receber e prestar contas do seu recurso.
O que são e a para que servem as transferências para os municípios.
CLP – O prazo de validade no Fundeb é 2020. Ele pode ser extinto?
É muito difícil extinguir o Fundeb. Existe um consenso muito grande em todo o debate educacional de que ele foi um avanço muito grande para o Brasil, depois do Fundef, no sentido de dar uma equidade maior para o financiamento da educação. Tem uma simulação, feita por um consultor legislativo, que mostra que se não existisse o Fundeb a gente teria até 10 mil por cento de diferença de financiamento gasto por aluno entre municípios do Brasil. Com o Fundeb isso cai para 500 por cento, o que ainda é bastante.
Hoje a discussão que tem acontecido na Câmara dos Deputados, no Senado e em outras organizações que estão ajudando nesse debate, como Todos pela Educação, organismos multilaterais e etc., é de como que o Fundeb consegue resolver ainda mais essa questão da equidade e como ele consegue aperfeiçoar algumas coisas nos mecanismos de transferência. Então existem dois cenários mais prováveis:
- Um deles é o de simplesmente perenizar o Fundeb, tirando ele desta disposição transitória na Constituição e tornando-o um fundo permanente, mantendo o que a gente tem hoje e que está funcionando.
- O outro cenário seria o de melhorar ainda mais os mecanismos, que é o que todo debate hoje está girando em volta, de como melhorar mais ainda a equidade do fundo.
Há também um debate que traz a necessidade de a União complementar os recursos estaduais, mas essa é sempre uma discussão difícil porque o espaço fiscal do governo federal não está tão grande. Por um lado, o governo federal diz não ter tanto recurso para complementar e por outro os municípios e estados se sentem subfinanciados e pleiteam mais recursos para a União. Esse é um processo que temos que ver e devemos ter respostas mais concretas ao longo do ano que vem ou do outro. Mas o recado é: teremos um Fundeb contínuo e talvez mais forte ainda para reduzir as inequidades na educação.
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