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Nota técnica: Isenção do Imposto de Renda

O Imposto de Renda, no Brasil, tem sido uma questão de grande complexidade política, devido ao grande número de adultos diretamente afetados – cerca de 30 milhões de contribuintes ou declarantes. No entanto, justamente devido à grande importância desse tema, ele deve ser tratado com cuidado. Em todas as grandes democracias, por exemplo, tal instrumento não é apenas uma ferramenta arrecadatória, mas também utilizada para combater a desigualdade – e, vale mencionar, o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo.

No entanto, em que pese a situação do país, os rendimentos dos brasileiros mais ricos não são totalmente inclusos na base tributária. Isso se deve ao fato de que dividendos não são tributados, uma vez que há isenções e deduções que beneficiam os mais ricos (como plano de saúde) e perde-se receita do imposto sobre propriedade de alto valor uma vez que muitos municípios deixam de atualizar o valor de mercado ou o subestimam.

O Brasil, ainda, é um dos países com mais baixo percentual de receita tributária advinda de impostos diretos – seja sobre renda, lucros ou dividendos. Enquanto a média da América Latina é de 27%, no país é de cerca de 22%. Isso faz com que nosso sistema tributário seja relativamente regressivo, distribuindo menos a renda do que no resto do mundo via impostos.

Percentual da Receita Tributária por fonte na América Latina

Fonte: CEPAL

 Um dos fatores que contribuem para essa fraca arrecadação se deve às limitadas alíquotas, especialmente no topo da distribuição. No entanto, outro fator importante é a reduzida base tributária, ou seja, o baixo número de brasileiros que pagam qualquer tipo de imposto sobre seus rendimentos. Atualmente, o limite a partir do qual é necessário declarar sua renda para, a partir de então, ser tributado (não necessariamente sendo, a depender da fonte), é de pouco mais de R$ 28 mil por ano (cerca de R$ 2300 mensais, sem incluir 13º salário). Tal limite foi sendo progressivamente reduzido ao longo dos anos em termos reais (ou seja, considerando o aumento dos preços), pois muitas vezes o Governo Federal acabou por não reajustar a tabela das faixas do imposto.

Gráfico 1: Valor Real da Faixa de Isenção do IRPF por ano

Fonte: Pires (2021). Obs: a preços de 2020

Desse modo, muitos Governos e campanhas prometeram, em algum momento, realizar um forte reajuste da tabela do IRPF, uma medida que beneficiaria diretamente uma parte expressiva da classe média. Ao longo de 2021, o Governo Bolsonaro, por exemplo, prometeu um reajuste de 20% (levando a um rendimento mensal mínimo isento para cerca R$ 2700 a preços atuais), ainda que tenha abandonado a proposta. Já o presidente eleito Lula, durante sua campanha, prometeu aumentar a faixa de isenção do imposto para uma renda mensal de R$ 5000 mensais.  

Em relação a essa proposta, é preciso pontuar que, apesar de o Brasil ter uma proporção relativamente alta de população adulta isenta do pagamento do imposto, há uma piora significativa do perfil do imposto em relação ao resto do mundo. O percentual da população isenta de pagamento do IRPF não está em linha com os padrões internacionais, uma vez que a base de pagadores do Imposto de Renda, cerca de 30 milhões de brasileiros (menos de 30% dos adultos), é consideravelmente menor do que nos países desenvolvidos. 

Os Gráficos abaixo mostram que, enquanto muitos países não têm qualquer isenção para a população, com alíquotas mínimas variando entre 2 e 25%, aqueles que apresentam isenções, o fazem para cerca de apenas cerca de 10% da população – ao contrário do Brasil e Chile, que isentam cerca de 80% atualmente. Com a nova mudança, o Governo Brasileiro terá, de longe, a menor base de contribuintes do Imposto de Renda – com a maior faixa de isenção de sua história desde de 1996.

Indicadores de alíquota mínima do Imposto de Renda (IR) dos países

Fonte: Elaboração própria com dados da OCDE e LIS. Obs: Renda mediana calculada como média entre 2013 e 2019. Obs2: Menor alíquota sendo 0% é o equivalente a isenção para parte da população. Quando a menor alíquota é maior do que 0%, não há isenção.

Ainda adicionalmente, tal projeto beneficiaria, principalmente, a população mais rica do país. Como se vê no Gráfico abaixo, menos de 10% dos adultos brasileiros têm um rendimento mensal acima dos R$ 5000. Mesmo na situação atual, estamos falando de um percentual de cerca de 25% dos adultos mais ricos. 

Renda Individual Mínima de Adultos de cada Vintil

Fonte: PNADC 2021, com rendimentos multiplicados por 1.1

Muito se diz que a faixa de isenção no Brasil não é alta, mas o país que tem uma renda demasiadamente baixa. O argumento faz sentido até certo ponto (não se deve esquecer que só é possível arrecadar quanto se gera de renda), mas, mesmo sob tal lógica, os dados não sustentam tal conclusão. O Gráfico abaixo mostra a renda mediana (ou seja, daqueles que estão exatamente entre os mais ricos e mais pobres decada país) dos adultos da OCDE, e onde se aplicaria a faixa de isenção atual e proposta do Brasil. Como se vê, enquanto atualmente mais da metade mais rica dos adultos estaria isenta em países como a Romênia, Costa Rica, Turquia e México, cujo PIB per Capita é razoavelmente semelhante ao do Brasil, com a nova proposta, outros 11 países entrariam para a lista, incluindo Portugal, Grécia, Israel, Estônia e Japão. 

Renda Mediana de Adultos de 18 a 65 anos dos Países da OCDE

Fonte: OCDE

A tabela abaixo, por fim, mostra o número de brasileiros que ganham ou mais do que R$ 2300 (faixa atual) ou mais de R$ 5000 (faixa proposta), além de seus rendimentos mensais médios. Desse modo, é possível ver que mais de 2/3 dos contribuintes atuais deste imposto acabariam isentos de tal imposto.

Total da População e Renda Média da População Atual e Potencialmente Isenta do Imposto de Renda

Fonte: PNADC 2021, com rendimentos multiplicados por 1.1

Assumindo uma alíquota média de cerca de 10% para aqueles que, hoje, ganham entre R$ 2300 e R$ 5000 mensais, a perda arrecadatória da medida seria de quase R$ 80 bilhões de reais anuais. Mesmo imaginando que, em uma reforma mais ampla, o Governo conseguisse aprovar um aumento da alíquota média de 2 pontos percentuais daqueles que ganham acima de R$ 5000, ainda assim a perda seria de mais de R$ 50 bilhões. 

Desse modo, o CLP defende uma mudança no sentido contrário, de aumentar a base tributária, ainda que com alíquotas reduzidas na base, e maiores no topo. Assim, o Imposto de Renda aumentaria fortemente seu potencial arrecadatória, colocando o Brasil no mesmo patamar dos demais países. No entanto, com tal medida, também seria necessário aprovar uma medida para atualizar as faixas tributárias pela inflação anualmente, de modo a não permitir novos aumentos com pouca transparência.

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