Introdução
A aprovação de uma norma que regulamente o teto remuneratório do funcionalismo público dentro do limite definido pela Constituição é fundamental para o Brasil. Hoje, o teto salarial é de R$ 39,2 mil1– há casos, porém, de servidores públicos que “turbinam” seus ganhos com os chamados “penduricalhos”. Estão aí incluídos os que recebem auxílios (auxílio-livro, auxílio-creche, auxílio-moradia, “auxílio banda larga” etc), horas extras, adicionais noturnos e demais verbas indenizatórias que, na soma, extrapolam o valor mensal definido pelo teto.
“Supersalário” é uma remuneração mensal no setor público acima do limite da Constituição. O Projeto de Lei 6726/2016, em tramitação na Câmara dos Deputados2, visa regular nacionalmente a definição de remuneração indenizatória. O objetivo do PL é justamente impedir o acúmulo dos “penduricalhos” para que não ultrapassem o teto definido por lei.
Por que tal legislação é importante? Em primeiro lugar, porque limitar os “supersalários” abre espaço no orçamento público para a realocação de recursos em áreas prioritárias, como educação, saúde e para o combate à Covid-19.
Levantamento do Centro de Liderança Pública (CLP) a partir da PNAD Contínua aponta que cerca de 0,23% dos servidores estatutários do Brasil têm rendimentos efetivos superiores ao teto do funcionalismo (de R$ 39,2 mil mensais), com um adicional médio de rendimento mensal de cerca de R$ 8,5 mil.
Levando em consideração que o país possui cerca de 11 milhões de servidores públicos (o número total é subestimado na PNAD Contínua), isso equivale a aproximadamente 25 mil servidores com proventos acima do teto (0,23% x 11 milhões de servidores).
Dados da mesma fonte, detalhados adiante na nota técnica, permitem concluir que o Brasil pode economizar até R$ 2,6 bilhões por ano apenas cortando as remunerações acima do teto do funcionalismo público nas três esferas (Executivo, Legislativo e Judiciário) e nos três níveis de governo (federal, estadual e municipal).
Limitar os “supersalários” também é uma questão de estimular o melhor uso dos recursos públicos, além de dar maior racionalidade e tratamento equânime às remunerações no setor governamental.
Detalhamento
Apesar da grandeza do número de 25 mil servidores públicos que recebem acima do teto, trata-se de uma quantidade diminuta em comparação com o total de funcionários públicos existentes no Brasil (0,23%).
Ou seja: um pequeno contingente do setor público concentra grandes remunerações.
É possível calcular a massa de rendimentos acima do teto definido pela Constituição em R$ 2,6 bilhões por ano (25 mil servidores x 12 meses x R$ 8.500). A regulamentação do teto permitiria economizar, portanto, esse volume de recursos para os cofres públicos.
É válido considerar que parte dos ganhos de renda efetiva do trabalho dos servidores acima do teto pode ter caráter legitimamente indenizatório. Tendo em vista apenas cerca de 20% de tais ganhos, a economia a ser obtida com remunerações acima do teto ainda assim ficaria em aproximadamente R$ 2 bilhões por ano.
É possível desagregar a estimativa de economia por nível de governo, conforme a tabela abaixo:
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A grosso modo, é possível dizer que o contingente de 25 mil servidores que recebem acima do teto seria equivalente à população de uma cidade pequena, como Guararema3 ou Ilha Solteira4 (no interior de São Paulo).
É possível concluir que boa parte dos casos ocorre na esfera federal e estadual, observando-se a pesquisa do CLP a partir da PNAD Contínua.
Outro levantamento, do jornal Folha de São Paulo, ressalta como os supersalários parecem estar majoritariamente no Judiciário: 8.226 magistrados receberam remuneração igual ou superior a R$ 100 mil pelo menos uma vez desde 20175.
Outro estudo, desta vez realizado pelo Partido Novo, aponta que 7 em cada 10 salários de juízes e magistrados estão acima do teto constitucional6.
Faz sentido, portanto, que a maior parte dos casos de supersalários sejam identificados na esfera federal e estadual: é onde se concentram as contratações e custos do Poder Judiciário.
Exemplos e casos adicionais a seguir:
Benefícios a procuradores e juízes avançam e somam R$ 543 milhões na pandemia
Uma juíza de Pernambuco recebeu salário de R$ 1,3 milhão em 2019
Verbas indenizatórias deram salário de mais de R$ 700 mil a juiz de Minas
‘Eu não tô nem aí’, diz juiz de MT que recebeu salário de mais de R$ 500 mil
A conclusão de que a massa de rendimentos acima do teto pode chegar a R$ 2,6 bilhões por ano é consistente com a pesquisa feita pelo Ministério do Planejamento, com base no estudo do Ministério Público, com dados do CNJ/Justiça em números – 2017. Neste último levantamento, o dado encontrado foi de pouco mais de R$ 2,5 bilhões gastos com remunerações que ultrapassam o teto constitucional.
Numa conta simples, a quantia que pode ser economizada com o fim dos supersalários equivale, por exemplo, ao custo de 16 fábricas de vacinas contra a Covid-19 do Instituto Butantan7.
O Portal da Transparência do governo federal evidencia o orçamento total (despesas obrigatórias e não-obrigatórias) de cada ministério nos últimos anos8. A economia anual estimada de R$ 2,6 bilhões que pode decorrer do fim dos supersalários equivale a:
● Mais de dez vezes a despesa total executada do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos no ano de 2020 (R$ 253 milhões)9;
● Mais de duas vezes e meia a despesa total executada da Controladoria-Geral da União no ano de 2020 (R$ 1,01 bilhão)10;
● Cerca de uma vez e meia a despesa total executada do Ministério das Comunicações no ano de 2020 (R$ 1,81 bilhão)11;
● Pouco mais que a despesa total executada do Ministério do Meio Ambiente no ano de 2020 (R$ 2,25 bilhões)12.
Além disso, o Portal da Transparência torna possível comparar os orçamentos previstos dos ministérios neste ano com o valor a ser economizado com a extinção dos penduricalhos e ganhos acima do teto constitucional – R$ 2,6 bilhões. Tal valor equivale a:
● Mais de quatro vezes a despesa total prevista do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos para o ano de 2021 (R$ 618 milhões)13;
● Cerca de 95% da despesa total prevista do Ministério do Turismo para o ano de 2021 (R$ 2,74 bilhões)14;
● Cerca de 62% da despesa total prevista do Ministério das Relações Exteriores para o ano de 2021 (R$ 4,20 bilhões)15.
Por fim, na comparação com o orçamento discricionário (não-obrigatório) dos ministérios previsto para 202116, segundo dados do Portal G1, a economia de R$ 2,6 bi equivale a:
● Quatro vezes o orçamento discricionário previsto do Ministério do Turismo para o ano de 2021 (R$ 661,2 milhões);
● Uma vez e meia o orçamento discricionário previsto do Ministério das Relações Exteriores para 2021 (R$ 1,7 bilhão);
● Mais de uma vez o orçamento discricionário previsto do Ministério da Agricultura para 2021 (R$ 2,4 bilhões);
● Uma vez o orçamento discricionário previsto do Ministério da Justiça e Segurança Pública para 2021 (R$ 2,6 bilhões).
O #UnidosPeloBrasil lançou, no segundo semestre de 2020, um abaixo-assinado pela aprovação do PL 6726/201617. Em poucos meses, mais de 270 mil assinaturas oriundas de cidadãos dos mais diversos estados se somaram ao documento.
Cerca de 30 parlamentares – entre deputados federais, senadores e deputados estaduais – assinaram a petição online, declararam apoio via redes sociais ou receberam as assinaturas no Congresso, assumindo compromisso com a pauta.
Alguns exemplos, em ordem alfabética:
● Deputada federal Adriana Ventura (NOVO-SP)
● Deputado federal Alexis Fonteyne (NOVO-SP)
● Deputado federal Evair de Melo (PP-ES)
● Deputado federal Felipe Rigoni (PSB-ES)
● Deputado federal Marcel Van Hattem (NOVO-RS)
● Deputada federal Paula Belmonte (Cidadania-DF)
● Deputado federal Paulo Martins (PSC-PR)
● Deputado federal Pedro Cunha Lima (PSDB-PB)
● Deputado federal general Peternelli (PSL-SP)
● Deputado federal Rubens Bueno (Cidadania-PR)
● Deputado federal Samuel Moreira (PSDB-SP)
● Deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP)
● Deputado federal Tiago Mitraud (NOVO-MG)
● Deputado federal Vinicius Poit (NOVO-SP)
● Senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE)
● Senador Alvaro Dias (Podemos-PR)
● Senador Antonio Anastasia (PSD-MG)
Histórico do Projeto de Lei
O Projeto de Lei foi proposto pela chamada Comissão Especial do Extrateto18, que debateu, no Senado Federal, o fim dos supersalários que extrapolam o teto da Constituição, há meia década atrás.
As discussões no Senado ocorreram em 2016, e o objetivo da comissão foi redefinir o que deveria e o que não deveria estar submetido ao teto remuneratório imposto pela Constituição para todo o funcionalismo público.
O Projeto de Lei, na época, ficou conhecido pela nomenclatura PLS 449/2016. Ele foi aprovado pelo Senado no mesmo ano19, e entrou em tramitação na Câmara dos Deputados na sequência.
Ao chegar na Câmara, a proposta legislativa passou a ser nomeada de PL 6726/2016. Desde 2018, o Projeto de Lei anda a passos lentos. O relator do Projeto na Câmara, deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), apresentou seu parecer à Comissão Especial que analisava a matéria, mas o texto ainda não foi apreciado20.
Em outubro de 2020, o #UnidosPeloBrasil criou um abaixo-assinado pedindo a aprovação do PL que extingue os supersalários. Em dezembro, o movimento levou as assinaturas da petição à Câmara dos Deputados, para serem entregues aos parlamentares, como forma de mostrar que a população deseja a votação do projeto21.
Mais de 10 parlamentares receberam as assinaturas da petição online. Além da sociedade, a Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa defende a votação do Projeto como prioritária22.
Para que o PL entre em votação rapidamente, a Câmara dos Deputados precisa analisar um dos quatro requerimentos de urgência apresentados à Casa Legislativa. O último dos requerimentos foi apresentado em novembro de 2020, porém o primeiro data de 201823.
Após a eleição para a presidência da Câmara e do Senado, o governo federal lançou uma lista de propostas que considera prioritárias para serem apreciadas pelo Legislativo. Entre as 34 medidas listadas está o projeto que prevê o fim dos supersalários24. A inclusão do PL 6726/2016 na lista de prioridades do governo dá novo fôlego à pauta e deve ser celebrada, pondera o relator na Câmara.25 A mobilização deve seguir os próximos passos com mais ações no Legislativo e adesões à petição online e nas redes sociais.
Análise por nível de governo
De acordo com a estimativa realizada pela área de Inteligência Técnica do CLP, 1,03% dos um milhão de servidores federais brasileiros têm rendimentos efetivos superiores ao teto, com um adicional médio de rendimento mensal de R$ 8.655.
Tal número representa cerca de 10.300 servidores federais recebendo acima do teto definido pela Constituição (1 milhão de servidores x 1,03%). Assim, é possível concluir que a economia com a regulamentação do teto em âmbito federal é de cerca de R$ 1,09 bilhão por ano (10.300 servidores x 12 meses x R$8.655).
Já nos estados, encontramos aproximadamente 13.600 servidores com proventos acima do teto (3,4 milhões de servidores x 0,40%). Neste recorte, a economia anual com o fim das remunerações acima do teto é de R$ 1,5 bilhão (13.600 servidores x 12 meses x R$ 9.151).
Por fim, nos municípios temos aproximadamente 1.300 servidores com rendimentos efetivos acima do teto (6,5 milhões x 0,02%). Portanto, a economia anual é de 0,01 bilhão (1.300 servidores x 12 meses x R$ 707).
É possível também identificar, a partir dos dados da PNAD Contínua de 2019, a distribuição de servidores que ganham acima do teto federal por nível de Poder. Considerando-se os 100% dos funcionários públicos que “furam” o teto constitucional, 54% deles trabalham em nível estadual, 40,2% trabalham para a União e 5,8% trabalham em nível municipal.
Além disso, se for considerada 100% da massa de rendimentos acima do teto, pouco mais de 58% desta massa está em nível estadual, 41,1% está em nível federal e 0,5% em nível municipal
Confira a tabela:
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Atuação do #UnidosPeloBrasil
O abaixo-assinado lançado em outubro de 2020 pelo movimento #UnidosPeloBrasil reuniu apoios significativos de toda a população e coletou mais de 270 mil assinaturas até agora. Além de parlamentares, houve adesão de economistas, advogados, juristas, professores de instituições públicas e dezenas de outros especialistas e profissionais de várias áreas.
A entrega das assinaturas no Congresso repercutiu na imprensa e nas redes sociais. Além da petição, o #UnidosPeloBrasil lançou uma carta pedindo adesões de outras organizações da sociedade civil (movimentos, coletivos, ONGs, fundações, associações etc) para engrossar o coro dos que defendem o fim dos supersalários.
Sob a bandeira #SuperSaláriosNão, 15 organizações assinaram a carta e declararam apoio à votação do Projeto de Lei 6726/2016. Algumas organizações estão listadas abaixo:
● Movimento LIVRES;
● Instituto Millenium;
● Ranking dos Políticos;
● Movimento Brasil Livre (MBL);
● Movimento ACREDITO;
● Associação Comercial de Pernambuco;
● Instituto Moreira Matos.
Conclusão
A pauta do fim dos supersalários tem mobilizado a população de forma crescente e contínua desde que o PL 6726/2016 foi apresentado. Se forem consideradas as interações, curtidas, comentários favoráveis, reportagens, artigos e demais apoios à votação do Projeto de Lei, além das assinaturas na petição, seguramente um milhão de pessoas já tomaram posição pelo fim das remunerações que extrapolam o teto constitucional.
Para além destes apoios, cabe ressaltar que o gabinete compartilhado do Movimento ACREDITO lançou, em dezembro de 2020, um documento em que defende a importância do fim dos supersalários e sua relação com a Reforma Administrativa.
O #UnidosPeloBrasil entende que esta reforma é crucial para o avanço do desenvolvimento social e econômico do Brasil, e concorda com o ACREDITO na importância de ambos os projetos. O fim dos supersalários não terá impacto negativo na população mais vulnerável do país – pelo contrário, irá reduzir a desigualdade salarial existente no setor público.
1 Fonte: Poder360. STF proíbe acúmulo de benefícios se valor superar teto constitucional
2 Fonte: Agência Câmara de Notícias. Frente parlamentar quer votação de projeto que regulamenta teto salarial do funcionalismo
3 Fonte: IBGE. População estimada para Guararema em 2020
4 Fonte: IBGE. População estimada para Ilha Solteira em 2020
5 Fonte: Folha. Mais de 8.000 juízes receberam acima de R$ 100 mil mensais ao menos uma vez desde 2017
6 Fonte. Partido Novo. NOVO Fiscaliza: Análise do Cumprimento do Teto Salarial no Serviço Público
7 Fonte: Instituto Butantan. Governo de SP inicia as obras da fábrica que produzirá Coronavac no Brasil
8 Fonte: Portal da Transparência. Comparativo entre órgãos superiores
9 Fonte: Portal da Transparência. Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Despesas do órgão: execução orçamentária e financeira 2020
10 Fonte: Portal da Transparência. Controladoria-Geral da União. Despesas do órgão: execução orçamentária e financeira 2020
11 Fonte: Portal da Transparência. Ministério das Comunicações. Despesas do órgão: execução orçamentária e financeira 2020
12 Fonte: Portal da Transparência. Ministério do Meio Ambiente – MMA. Despesas do órgão: execução orçamentária e financeira 2020
13 Fonte: Portal da Transparência. Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. Despesas do órgão: execução orçamentária e financeira 2021
14 Fonte: Portal da Transparência. Ministério do Turismo. Despesas do órgão: execução orçamentária e financeira 2021
15 Fonte: Portal da Transparência. Ministério das Relações Exteriores. Despesas do órgão: execução orçamentária e financeira 2021
16 Fonte: Portal G1. Orçamento 2021: veja quais áreas devem perder recursos, e quais terão mais verba no próximo ano
17 Fonte: #UnidosPeloBrasil. Diga NÃO aos supersalários pagos com verba pública! #SuperSaláriosNão
18 Fonte: Senado. Comissão Especial do Extrateto
19 Fonte: Senado. Senado aprova fim dos supersalários na administração pública. 20 Fonte: Folha. Relator de projeto dos supersalários restringe gratificações acima do teto constitucional
21 Fonte: SBT. Grupo entrega abaixo-assinado contra supersalários na Câmara 22 Fonte: R7. Câmara debate nesta quarta supersalários no serviço público 23 Fonte: R7. Câmara vota urgência de projeto que acaba com os supersalários. 24 Fonte: Agência Câmara de Notícias. Confira a lista de prioridades do governo na Câmara e no Senado
25 Fonte: Agência Câmara de Notícias. Relator de projeto que combate supersalários comemora inclusão do tema entre prioridades do governo