Mencionar que a infraestrutura é um entrave para a competitividade do Brasil é chover no molhado. Qualidade das rodovias, disponibilidade de voos diretos, mobilidade urbana, acesso à energia são indicadores do pilar de infraestrutura analisados no Ranking de Competitividade dos Estados, estudo do Centro de Liderança Pública. São itens que demandam constante atenção por parte de nossos governantes.
Há um consenso de que o setor público é responsável por prover, direta ou indiretamente, a infraestrutura de um país. Não se imagina que o setor privado seja capaz de organizar e desenvolver a infraestrutura sem a intervenção do governo.
Até recentemente, o modelo para desenvolver a infraestrutura brasileira tinha como base um apoio expressivo da poupança pública, seja no financiamento ou composição acionária dos empreendimentos (BNDES, FI-FGTS, Infraero, etc). A participação de empresas mistas de controle estatal também foi significativa neste modelo – Petrobras e Eletrobras, por exemplo.
No entanto, a atual restrição do orçamento público e o endividamento das empresas de economia mista impõem que uma parcela expressiva dos novos projetos de infraestrutura seja patrocinada e financiada pela iniciativa privada. Neste sentido, é importante ressaltar uma premissa básica da poupança privada: os poupadores do setor privado buscam retornos nos seus investimentos. Por meio de dividendos, no caso de participação acionária, ou juros, no caso de financiamento. Quanto maior o risco e a incerteza do empreendimento, maior o retorno esperado.
Quanto ao financiamento, a poupança privada conta hoje com uma atraente alternativa nas Notas e Letras do Tesouro Brasileiro. Não cabe aqui discutir a razão das taxas de juros estarem neste patamar. Porém, ao se tratar de financiamento para infraestrutura, é fundamental levar em consideração que esta alternativa existe.
Em junho de 2016, a atratividade de se investir em títulos da dívida pública brasileira fez com que 16,41% do total da dívida estivessem nas mãos de investidores não residentes. O que equivale a R$ 465 bilhões e torna os títulos brasileiros a maior exposição de investidores estrangeiros em dívida de moeda local em um país emergente.
Como o financiamento corresponde à maior parcela do capital empregado em infraestrutura, por volta de 70% do total, o custo da dívida brasileira é um componente importante da equação ao estabelecer um piso para esta remuneração. Com este patamar, remunerar o financiamento de infraestrutura apenas com as tarifas dos serviços prestados pode torná-los muito onerosos.
No modelo anterior, o financiamento subsidiado do BNDES contribuía favoravelmente com a equação, permitindo tarifas mais baixas. Uma das alternativas atuais é a contraprestação por parte do ente público. Nas PPPs, parte da remuneração do financiamento vem das tarifas cobradas, e parte das parcelas recebidas do poder público pelos serviços prestados. Isto faz com que seja imprescindível que o setor privado tenha conforto no recebimento das parcelas do ente público e de que não corra o risco de acabar com precatórios nas mãos. O grau de conforto está diretamente ligado à existência ou não da linha e ao custo de financiamento.
Por exemplo, o uso da alienação fiduciária no financiamento de imóveis foi fundamental para o desenvolvimento desta modalidade de empréstimo. Com ela, os credores passaram a ter um mecanismo eficiente para reaver seus empréstimos no caso de inadimplência. Logo, se sentiram mais confortáveis para alocar uma maior parcela dos seus recursos a este tipo de financiamento. Ao tentar proteger em demasia o devedor que estivesse com dificuldade em honrar seus compromissos, a regulamentação anterior era um entrave para o mercado imobiliário. Paradoxalmente, a regulamentação que visava proteger o devedor inibia a concessão de crédito e prejudicava justamente a parcela da população que dependia de financiamento para adquirir um imóvel.
No que diz respeito ao custo de financiamento, dados do Banco Central mostram que em agosto de 2016 uma mesma instituição cobrava 27% ao ano de juros em empréstimos consignados a servidores públicos e 89% ao ano para créditos pessoais não consignados. A consignação em folha não pressupõe depósito de garantias, muito menos os bens do tomador ficam alienados durante o período. O grande advento do mecanismo foi proporcionar ao financiador um acesso eficaz ao fluxo de caixa do tomador. Este mecanismo também existe para o setor público.
O governo federal considera importante que os Estados e municípios honrem o pagamento de seus empréstimos externos. Uma eventual inadimplência por parte de um Estado ou município pode prejudicar a credibilidade dos demais entes e do próprio governo federal junto a investidores externos. Por isso, foi estabelecido um mecanismo. Caso um ente deixe de pagar uma obrigação de crédito externo, o governo federal faz o pagamento no seu lugar e é ressarcido por meio do bloqueio de recursos para este ente. Assim, sem usar recursos próprios, o governo federal evita a inadimplência destes contratos e impõe a responsabilidade de pagar ao devedor.
Por que este mecanismo ou algo similar não pode ser replicado para as PPPs estaduais e municipais?
O básico, apesar de muitas vezes simples, não é necessariamente o mais fácil de ser implementado. Colocar-se na obrigação de honrar compromissos assumidos pode não ser muito confortável, porém, o contrário não parece ser uma alternativa válida. Como financiar alguém que na prática tem a opção de postergar o pagamento e não o efetuar nas condições acordadas?
A eficácia das soluções para a infraestrutura no Brasil dependerá de muito diálogo, transparência, força de vontade e suor. Alternativas estão sendo utilizadas, por meio da constituição de garantias, para viabilizar empréstimos de infraestrutura, mas talvez focar no básico possa dar mais resultado.