Foto de Edilson Rodrigues da Agência Senado
O crescimento da população gerou uma consequente expansão na produção de lixo nas cidades, contudo, as políticas públicas de resíduos sólidos não acompanharam este aumento. Para reverter este cenário, após 20 anos de discussão no Congresso Nacional, a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) foi sancionada em 2010, propondo orientações e a gestão compartilhada, no qual todos – governos, empresários e consumidores – deveriam agir em conjunto.
As cidades que já atendem serviços complexos como saúde e educação, justificam que não possuem recursos financeiros e técnicos para atender à diretriz federal. Além disso, com a recessão econômica e a diminuição de repasses financeiros, algumas prefeituras que estavam adequadas à lei, retrocederam para a utilização de aterros intermediários e lixões (confira matéria).
O CLP conversou com diversos prefeitos e prefeitas neste ano e constatou que a questão de resíduos sólidos representa mais um desafio que as cidades enfrentam. Para compreender melhor o assunto, preparamos um conteúdo sobre a PNRS e uma entrevista com um especialista no assunto.
1 – Compreendendo a Política Nacional de Resíduos Sólidos
A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída pela Lei 12.305/2010, trouxe um conjunto de novas oportunidades e obrigações desde os consumidores aos produtores, importadores e distribuidores de resíduos às empresas de prestação de serviços de coleta e disposição final. Entre seus principais pontos, reforça a destinação adequada dos resíduos, estabelece metas para a erradicação de lixões, exige a obrigatoriedade na elaboração de planos estaduais e municipais, entre outras medidas. Confira no infográfico:
1.1 Entraves nos municípios
Em vigor desde 2010, a PNRS ainda não foi totalmente implantada. A geração de resíduos se mantém em patamares elevados e o país tem mais de três mil municípios com destinação inadequada, apesar da proibição existente desde 1981 e do prazo estabelecido pela PNRS ter-se encerrado em 2014. Entre os principais motivos estão:
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Carência de recursos: os serviços de limpeza urbana são de responsabilidade dos municípios, contudo, a gestão e a manutenção dos aterros sanitários exige altos gastos, assim, a maioria das cidades não conseguem custear o serviço de forma isolada. Em 2016, as prefeituras do país já acumulavam uma dívida em torno de R$ 8 bilhões com as empresas que realizam esses serviços.
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Baixa capacidade institucional: os municípios alegam que não possuem capacitação e corpo técnico adequado para a elaboração de planos municipais/regionais e arranjos na forma de consórcios.
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Ausência de integração: A erradicação dos lixões depende da integração da política com a execução das propostas, principalmente da logística reversa e a responsabilidade compartilhada que não estão funcionando na prática.
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Questão cultural: Enquanto não houver a redução na quantidade de lixo produzida pela população, continuará havendo a dificuldade de gerenciar os resíduos sólidos. Outra dificuldade envolve as prefeituras que se recusam a criar e cobrar as taxas de lixo por ser tratar de uma questão impopular ao gestores municipais
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Prazos contratuais: a Confederação Nacional dos Municípios pede mudanças na legislação sobre a formação de consórcios entre cidades para a construção de aterros, principalmente em questões ligadas à contratação de pessoal e ao recebimento de recursos federais.
2 – Conversa com Victor Zveibil
O CLP conversou com Victor Zveibil, que entre 2011 a 2014 atuou como Superintendente de Políticas de Saneamento da Secretaria de Estado do Ambiente (SEA/RJ), tendo sido responsável pela coordenação da implementação do Pacto pelo Saneamento – programas Lixão Zero e Rio + Limpo. Victor esclarece algumas questões quanto à temática de resíduos sólidos:
1) Quais são as principais dificuldades para os municípios implementarem as diretrizes da PNRS?
VZ: Os municípios vivenciam um cenário crítico de recursos escassos e diminuição de repasses, contudo, essas dificuldades não podem ser determinantes. A PNRS possibilita diferentes mecanismos que visam a diminuição de custos na gestão dos resíduos sólidos e a geração de escala. Outro problema é o desconhecimento dos próprios custos, ou seja, muitas cidades não sabem o valor dos serviços que oferecem, dessa forma, é inviável elaborar um bom plano de resíduos e cobrar taxas e tarifas, por exemplo. Muitas prefeituras costumam não cobrar pelo serviço prestado, a taxa de coleta de lixo é um instrumento constitucional e legal que auxilia a cidade no pagamento das despesas com a sua gestão de resíduos sólidos.
2) Quais são os mecanismos que a PNRS oferece?
VZ: A PNRS introduz os estudos de regionalização, pois não é viável para um município que produz menos de 200t/dia manter sozinho um aterro sanitário. Dessa forma, as cidades apoiadas pelos governos dos estados, podem desenvolver planos regionais e intermunicipais, compartilhando a gestão dos resíduos sólidos, elevando a escala e minimizando os custos por unidades. A localidade pode optar por consórcios, parcerias público-privadas, concessões, tudo depende do estudo de regionalização que aponta o que é mais viável e adequado. Além disso, municípios com muita produção de lixo atraem o interesse do setor empresarial.
3) Qual são as atribuições dos governos estaduais para com os municípios?
VZ: Além da elaboração dos Planos Estaduais de Resíduos Sólidos e do licenciamento de unidades para o tratamento e disposição final dos resíduos, os governos estaduais podem realizar ações como os estudos de regionalização, promover instrumentos de incentivos ao municípios e fornecer apoio financeiro e auxílio com o planejamento das cidades, como os planos municipais e regionais.
4) Qual o papel do catador de lixo dentro da PNRS?
VZ: O catador de lixo é visto como um importante agente ambiental, que contribui com a gestão de resíduos sólidos municipal. A partir da lei, os catadores devem trabalhar em um local digno e receberem uma remuneração municipal, além do valor do material separado/vendido. As prefeituras devem trabalhar de forma social, organizando os catadores e os auxiliando na coleta seletiva.
5) Qual é o impacto de uma má gestão de resíduos sólidos para os municípios?
VZ: Os impactos envolvem questões ambientais e de saúde pública, contaminação das águas, terra, solo (chorume), encarecimento do tratamento de água, desvalorização imobiliária, além da atração de diferentes vetores, ocasionando piora da qualidade de vida da população.
6) Quais são os primeiros passos para os municípios?
VZ: As cidades devem desenvolver um plano de gestão de resíduos sólidos, promover capacitações, investir em transparência e cobrança de taxa e tarifas adequadas que consigam custear as despesas municipais e promovam uma boa gestão de resíduos sólidos.
Conheça o caso do Programa Lixão Zero no Estado do Rio de Janeiro.