A alocação de R$ 5,7 bi no orçamento para o Fundo Eleitoral em 2022
Alguns aspectos chamam negativamente a atenção no que diz respeito à alocação de recursos orçamentários para alimentar o Fundo Eleitoral de 2022.
- Não estamos discutindo a existência desse recurso. Ele pode equilibrar o jogo entre partidos com potenciais arrecadatórios distintos, e não parece possível retroagir em relação a ele nesse instante. A questão central não é essa. O primeiro problema é: em 2018, primeiro ano em que tivemos esse recurso sendo utilizado nas eleições, o país investiu R$ 1,7 bilhão nas campanhas. Em 2019, tendo em vista o orçamento de 2020, parlamentares argumentaram que o recurso deveria sofrer uma correção condizente com o fato de que as eleições municipais mobilizam mais candidaturas – cerca de 20 vezes mais – que os pleitos nacionais e estaduais. Aventou-se, via relator do orçamento à ocasião, a cifra de R$ 3,8 bi, que a despeito de não atender à proporcionalidade do total de candidaturas, representava um aumento superior a 100% no valor de 2018. A iniciativa foi freada e tentativas de aumento foram vetadas, corretamente, pelo presidente Jair Bolsonaro em setembro de 2019. Em 2020, o Fundo ficou abaixo de R$ 2 bilhões. Assim, pergunta-se: o que justifica um incremento de três vezes no valor utilizado no pleito municipal do ano passado? A nosso ver: nada.
- O instante econômico que o país vive é calamitoso. Somos contrários ao discurso de que contenção de recursos devem ocorrer em tempos de crise, e gastos extras e desnecessários podem acontecer em tempos de prosperidade. Antes de avançarmos nesse ponto, devemos instituir uma lógica absolutamente republicana que dialogue com nossas obrigações constitucionais em termos de investimento público. Isso em nosso país, repleto de privilégios, não existe. Assim, mais uma vez: nada parece justificar três vezes mais recursos para este Fundo, a despeito do instante que vivemos.
- A nós parecia estranho assistir, principalmente, parlamentares governistas se posicionarem publicamente nas redes sociais contra o aumento do citado Fundo e votarem SIM à elevação do valor destinado a ele. Mas aqui um ponto merece absoluta atenção. O aumento não foi votado em separado. Ou seja: o SIM foi para a peça do ciclo orçamentário que está em votação. A questão agora é compreender se tal reserva orçamentária será mantida e, principalmente, se terá uma votação em separado aceita. Partidos fizeram o pedido, e ele foi inicialmente recusado. Ao término de todo o processo, se aprovado o valor, a pressão recairá, novamente, sobre o Poder Executivo – que poderá vetar.
- Por fim, diante das mudanças que estão sendo previstas para o sistema eleitoral brasileiro, a questão central é: faz sentido elevar o recurso do Fundo Eleitoral e flertar com um modelo ruim e questionável que, em tese, reduzirá de forma expressiva o total de candidaturas em pleitos proporcionais? A adoção do trágico Distritão, em tese, faz com que cada partido lance um total menor de candidatos aos pleitos que hoje são disputados sob a lógica proporcional. Mudança alguma em sistemas desse tipo devem ser vistas de forma isolada. Assim, alargar o orçamento e discutir mudanças na lógica do sistema proporcional nos sugere que menos políticos terão disponíveis mais recursos públicos para suas campanhas. Estudos nos mostram, de forma evidente, que os valores dos fundos controlados pelos partidos tendem a se concentrar nas mãos de seus dirigentes e líderes – sobretudo aqueles com mandatos. Tal movimento pode constranger, ainda mais, ações atreladas à lógica da renovação e da entrada democrática de agentes da sociedade que desejam participar do próximo pleito. A perpetuação dos eleitos no poder não é ato saudável, e se reforça com o exagero de recursos públicos controlados por eles. Ademais, pleitos majoritários tendem a ser mais caros que eleições proporcionais, e características específicas de cada um deles têm impactos sobre a lógica de valores dispendidos. O Distritão, em tese, pode ser um sistema caro, mas sua tenebrosa adoção não pode, de maneira alguma, recair sobre o orçamento da União com incremento absurdo ao Fundo. Se democrática e politicamente tal sistema está fadado ao absurdo, economicamente isso não pode aprofundar tal abismo.