A é um dos fatores decisivos para romper as desigualdades entre o setor público e o privado, , já que prevê uma revisão geral de como funciona o sistema de incentivos e reconhecimento no setor público. Neste artigo, apresentamos a Reforma Administrativa em Portugal, que aconteceu em 2008, após sua máquina pública viver um inchaço que comprometeu os investimentos do país.
A trajetória pela qual o país passou, mostra o quanto governos responsáveis são capazes de enfrentar os problemas públicos de forma transparente e democrática, aprovando medidas necessárias para a melhoria da vida da sua população, mesmo que contem com uma ampla oposição.
O Brasil precisa fazer uma série de reformas, tendo como objetivo, melhorar as contas públicas e o bem-estar geral da população. Após a aprovação da reforma da previdência em 2019, o governo começa 2020 com indícios de que novas mudanças são necessárias.
Por que Portugal precisou de uma Reforma Administrativa?
Com a crise financeira em 2008, alguns países, como Portugal, estavam bastante vulneráveis, por apresentarem um alto endividamento e um consecutivo déficit público. O PIB (Produto Interno Bruto) português sofreu consecutivas quedas e a taxa de desemprego atingiu quase 17%. Além disso, os portugueses também viram a sua qualidade de vida despencar.
Para reverter esse cenário, Portugal precisou pedir ajuda financeira ao FMI (Fundo Monetário Internacional) e à União Europeia. Em contrapartida, foi necessário aplicar políticas de austeridade e uma reforma administrativa.
Assim, o país implementou um conjunto de medidas para solucionar dois grandes problemas estruturais do funcionalismo público: a complexidade administrativa e o custo elevado.
Com o objetivo de simplificar o sistema, Portugal decidiu substituir mais de mil carreiras existentes por apenas três carreiras gerais e algumas específicas. As carreiras gerais estão distribuídas por todo o Estado e exercem funções administrativas, de nível básico, intermediário e superior. As carreiras especiais são típicas de uma profissão específica, por exemplo, professores, médicos, dentistas e enfermeiros.
Já para conter os altos custos do funcionalismo público foram estabelecidas outras medidas, como: fim da progressão automática por tempo de serviço; taxa de reposição dos servidores de 2:1, ou seja, duas aposentadorias são necessárias para uma nova contratação, e possibilidade de entrada lateral, que abriu espaço para as pessoas fora do serviço público disputaram vagas em níveis mais elevados.
Os protestos que tomaram Lisboa
Como já era esperado, as políticas de austeridade, associadas a uma alta taxa de desemprego, fizeram com que Portugal vivesse um período muito turbulento, tendo que conviver com consecutivos protestos e manifestações de sua população.
Os manifestantes compostos pela oposição de esquerda, entidades sociais e sindicatos, diziam que os severos ajustes e reformas com as quais as autoridades lusas se comprometeram eram responsáveis pela crise que o país vivia. Portanto, eles reivindicaram o fim dessas políticas, pois acreditavam que a população iria ter que arcar com os custos do processo.
Um grande protesto aconteceu na Avenida da Liberdade, e contou com cerca de 200 mil manifestantes contra a nova lei da Reforma Administrativa. A Associação Nacional das Freguesias, organizadora da manifestação, dizia que a reestruturação administrativa do Estado era desnecessária e sem sentido.
Diversos políticos de oposição começaram a se manifestar contra a medida. O social-democrata, Antônio Capucho, declarou que a nova reforma se caracterizava por ser “um disparate completo”.
Pedro Soares, dirigente do Bloco de Esquerda, denunciava o caráter autoritário da medida, pois vários municípios eram contrários à reforma apresentada, e disse “O Governo queria colocar nos municípios o ônus da apresentação de propostas de extinção de mais de um milhar de freguesias. Porém, a grande maioria recusou-se a participar numa reforma antidemocrática, que coloca em causa a autonomia autárquica e não permite a participação das populações”. Enquanto isso, Armênio Carlos, líder do sindicato CGTP — o mais importante de Portugal -, organizava protestos em Lisboa, onde culpava o governo pelo aumento da miséria, o desemprego e a pobreza no país, e rejeitava os novos cortes na administração pública.
Entretanto, mesmo com as constantes manifestações, o governo tinha uma base forte no parlamento, e como já havia se comprometido com a EU e o FMI, ele decidiu seguir em frente e colocar o projeto em votação.
A proposta de lei do Governo para a Reforma Administrativa foi aprovada, e acabou sendo promulgada em novembro de 2012. O projeto contou com o apoio da maioria parlamentar.
Quais foram os resultados?
O PIB de Portugal apresentava resultados pífios. Em 2009, a queda foi de 3%, e nos anos seguintes, 2011 e 2012, os portugueses viram a sua economia encolher novamente.
Após a aprovação da reforma, em 2012, o país passou a apresentar dados bem melhores. Em 2014, os lusitanos viram iniciar um ciclo de alta, com um leve crescimento de 0,9%. Os anos consecutivos foram de taxas de crescimento positivas, tendo o seu ápice em 2017, com 3,5% de aumento.
A maior crítica da população, a alta taxa de desemprego, apresentou uma grande melhora. Em 2012, a taxa apresentava altíssimos 16,70%, enquanto no ano passado, 2019, a taxa ficou em apenas 6,5%.
O endividamento do país mudou de patamar. No gráfico abaixo, é possível ver como o país teve uma queda vertiginosa em seu endividamento não financeiro, que é composto pelo Estado, empresas públicas e privadas e famílias. Caindo de 427,7% em 2013 para 363,8% em 2018, o que mostra que o conjunto de medidas em prol do saneamento das finanças foi muito bem executado.
A reforma também foi essencial para a melhoria no bem-estar dos portugueses. O IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), que avalia a qualidade de vida em determinado país, indicava, em 2012, que os portugueses residiam no 111° melhor lugar, enquanto no índice de 2017, Portugal já aparecia em 41°.
Outro ponto que foi levantada pelos manifestantes, era de que as medidas do governo iriam aumentar a miséria, entretanto não foi isso que aconteceu. O Índice de Gini, que tenta mensurar a desigualdade em uma região, apresentou uma forte queda após 2013. Em 2018, Portugal registrou o menor valor de sua história, de 31,9%.
O país pode ser um bom exemplo de sucesso para mostrar que mudanças estruturais são necessárias. Apesar de difíceis, só com elas é possível ter um crescimento sustentável.
Além do crescimento econômico de Portugal, também veio uma grande melhoria na eficiência e qualidade dos serviços, fazendo com que o padrão de vida da população melhorasse. Isso, sem contar com as inúmeras possibilidades de investimento que um governo, com as contas públicas em dia, pode fazer.
Igor Zimermann é estudante de Engenharia Elétrica na UNESP. Já foi presidente da Liga de Mercado Financeiro FEB e embaixador da Fundação Estudar. Amante dos assuntos econômicos e políticos, sonha que um dia a educação estará ao alcance de todos!