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O marco fiscal aprovado no Senado

Posicionamento

Esta é uma avaliação do texto aprovado no último dia 21, no Senado Federal, que estabelece o novo arcabouço fiscal e as regras e diretrizes para o controle de gastos e receitas do Estado. A proposta se desenvolve ao redor de alguns pontos-chave, os quais foram avaliados de forma separada.

1)  Parâmetros da Regra

Versão original – Os parâmetros que limitam o crescimento do gasto real valem somente para o período 2024/2027. Depois desse período, essas balizas podem ser mudadas pelo PLDO no primeiro ano de cada mandato presidencial, fato que fragiliza a regra fiscal dado que é mais simples alterar LDOs que leis complementares[1].

Substitutivo Câmara – Os parâmetros são incorporados na lei complementar,

Parecer Senado – Manutenção da alteração promovida pela Câmara.

Posicionamento CLP – Alteração promovida pela Câmara e mantida pelo Senado é positiva, pois traz maior estabilidade e previsibilidade para a regra fiscal.

2)  Exceções ao “teto Haddad”

Versão original – Exclusões do limite de gastos como o gasto referente ao auxílio financeiro complementar do Governo Federal para cumprimento do piso da enfermagem, despesas com aumento de capital de empresas estatais não financeiras e não dependentes, complementação da União ao Fundeb e transferências constitucionais da União ao FCDF (Fundo Constitucional do DF)

Substitutivo Câmara – Inclusão no limite de gastos do aumento de capital de estatais não financeiras e não dependentes, piso da enfermagem, complementação da União ao Fundeb e transferências da União ao FCDF. Os recursos transferidos ao FDCF não serão mais indexados à RCL da União (a correção será feita segundo os critérios utilizados na correção do limite de gastos)

Parecer Senado Exclui do limite de gastos a Complementação da União ao Fundeb, transferências constitucionais da União ao FCDF além de despesas com ciência, tecnologia e inovação. As transferências ao FCDF permanecem vinculadas à variação da RCL da União. Por fim, foi criado o Comitê de Modernização Fiscal.

Posicionamento CLP – Segundo nota da CONOF, na temática das exclusões de despesas do limite de gastos, é recomendado que as despesas excluídas obedeçam a alguns critérios, como: a) transferências constitucionais por repartição de receita; b) outras despesas acompanhadas de fontes de custeio vinculadas e c) créditos extraordinários.

Importante notar que as exceções mencionadas acima não atendem aos critérios citados sendo, portanto, negativo a exclusão de tais despesas do limite de gastos.

3)  Alterações na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)

Versão original – Alterações na governança da LRF. Não será mais obrigatório o contingenciamento de gastos em caso de risco de não cumprimento da meta de resultado primário. Em outras palavras, todo controle de despesa ao longo da execução fiscal anual não será mais obrigatório. Consequentemente, o descumprimento da meta de primário não configura mais infração à LRF. A medida é negativa pois retira poder dos agentes públicos frente a grupos de pressão e interesses particulares[2].

Substitutivo Câmara O contingenciamento de recursos, em caso de risco de descumprimento da meta de primário, continua obrigatório. Importante notar que parcela do gasto discricionário ficará protegida dos contingenciamentos.

Parecer Senado Manutenção da alteração promovida pela Câmara.

Posicionamento CLP – É importante manter a governança atual da LRF, mantendo-se a obrigatoriedade do contingenciamento de recursos no caso de risco de descumprimento da meta de primário.

4)  Medidas de Correção Fiscal

Versão original – Sem vedações

Substitutivo Câmara – Em caso de descumprimento do limite inferior do intervalo de tolerância da meta de resultado primário, para além do redutor de 50% (crescimento real das despesas será de 50% do crescimento real das receitas do ano anterior, e não 70%) uma série de vedações são acionadas (incisos II, III, VI a X do art. 167-A)[3].

Mantendo-se o descumprimento da meta nas apurações anuais seguintes outras vedações, de maior impacto, também poderão ser aplicadas[4]

Nesse sentido, poderosos instrumentos de controle de gastos com pessoal, como a vedação de 1) reajuste de salários, 2) admissão ou contratação de pessoal e 3) realização de concurso públicos, só poderão ser utilizados dois anos depois do descumprimento da meta de primário (assim, caso a meta de primário não seja cumprida em 2023 e 2024, apenas em 2025 estará vedada a autorização de reajustes, realização de concursos e admissão de pessoal).

Também foi estabelecido que, caso as despesas obrigatórias primárias ultrapassem 95% das despesas primárias totais (gatilho da chamada EC Emergencial) sinalizando, assim, pouca flexibilidade no orçamento e baixo espaço para gastos discricionários, uma série de gatilhos focados em conter os gastos públicos serão acionados (art 167-A inciso I a IX)

Importante notar que foi colocada uma “cláusula de escape” a qual permite ao Presidente enviar legislação ao Congresso propondo suspensão parcial ou gradação do conjunto de medidas de ajuste fiscal previstas demonstrando que as vedações de fato adotadas serão suficientes para alcançar o limite inferior do intervalo de tolerância da meta de primário.[5]

Parecer Senado – Manutenção da inclusão das medidas de ajuste fiscal acrescentadas pela Câmara, acrescentando também a alienação de ativos e privatização de estatais como medidas de ajuste fiscal possíveis.

Posicionamento CLP – Uma alteração importante que poderia ser feita agora que o texto retorna para a Câmara é a utilização das três medidas de correção fiscal mencionadas anteriormente já no ano seguinte ao descumprimento da meta e não após dois anos buscando-se, assim, dar maior celeridade ao ajuste fiscal. Além disso, a cláusula de escape é negativa, pois traz incerteza para a aplicação integral das medidas de ajuste fiscal dado que ela permite ao executivo adotar somente parte das vedações.

5)   Demais pontos

  • Aumentos reais no Salário Mínimo explicitamente excluídos do conjunto de vedações, especificamente do inciso VIII do art 167 -A, o qual proíbe adoção de medida que traga aumento real da despesa obrigatória.
  • Fixação em 2,5% (limite máximo) do crescimento real da despesa em 2024, fugindo, de modo bastante casuístico, da regra geral. Nesse sentido, consideramos importante a utilização da regra geral já em 2024.

Conclusão

De modo geral, o parecer emitido pelo Senado Federal foi na direção correta ao manter a mecânica do novo teto de gastos proposto originalmente pelo Executivo além de também ter mantido todas as medidas de correção fiscal introduzidas pela Câmara. O relator também manteve a obrigatoriedade de contingenciamento de recursos em situações de risco de não cumprimento da meta de resultado primário, evitando, assim, o enfraquecimento da governança da LRF.

Por outro lado, o retorno de determinadas exclusões ao limite de gastos foi negativo. Além disso, a “cláusula de escape” das medidas de vedação fiscal também foi mantida, trazendo incerteza para o ajuste fiscal.

Por Pedro Trippi, coordenador de Inteligência Técnica do CLP


[1] Recomendações para o aprimoramento do arcabouço fiscal | Blog do IBRE (fgv.br)

[2] Avanços e retrocessos na regra fiscal – 22/04/2023 – Samuel Pessôa – Folha (uol.com.br)

[3] II – Criação de cargos, empregos ou função que implique aumento de despesa;

III – Alteração de estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

VI – Criação ou majoração de auxílios, vantagens e benefícios de qualquer natureza;

VII – Criação de despesa obrigatória;

VIII – Medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação, observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso

IV do caput do art. 7º CF; (3)

IX – Criação ou expansão de programas e linhas de financiamento; remissão, renegociação ou refinanciamento de dívidas que impliquem ampliação de subsídios e subvenções;

X – Concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária.

[4] I – Aumentos e reajustes em geral na despesa com pessoal;

IV – Admissão ou contratação de pessoal, ressalvadas reposições de vacâncias, etc.

V – Realização de concurso público, exceto para as reposições de vacâncias previstas no inciso IV;

[5] Arcabouço tem melhorias, mas gasto cresce e regra fica mais complexa – 19/05/2023 – Marcos Mendes – Folha (uol.com.br)

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