Ricardo Henriques, superintendente executivo do Instituto Unibanco, costuma dizer que “o espaço público é muito maior que o governamental”. Gostei muito quando o ouvi falar isso primeira vez, por conta de que estava perto de dar esse passo em minha carreira, e ao mesmo tempo, curiosa sobre a viabilidade de mudar o mundo do terceiro setor.
Quando o passo foi dado, o primeiro aprendizado foi perceber que esses setores são muito parecidos, apesar de todas as suas diferenças. Não achei que viveria tão rapidamente os desafios que havia vivido no setor público. Isso porque o terceiro setor é totalmente impactado pelos desafios que o setor público vive. É o setor público no nosso espaço de trabalho e construção, com toda sua burocracia, desafio de escala, comunicação, financiamento etc. No entanto, do terceiro setor, você vive os problemas do setor público de outra forma, uma dicotomia difícil e angustiante de "é seu mas não é". Há um outro timing para resolução de questões, encaminhamentos e mobilização.
Do lado do terceiro setor há desafios também. Em primeiro lugar, por ser um setor tão plural, formado por fundações, institutos, ONGs exclusivamente voluntárias, etc. Nese meio, ainda há a distinção entre entes que, às vezes, se vêem mais do lado do mercado: com sua agilidade, pragmatismo, foco, e às vezes, mais livres e autônomas, horizontais e com foco no social. Assim, esse setor se localiza entre mercado e governos, ocasionalmente é executor, mercado, e por vezes, é governo.
Voltando à frase que abre essa reflexão, o desafio da educação pública é tão complexo que exige a participação de todos, não só os governos responsáveis. Antônio Nóvoa, educador português, comenta que “a escola pública é o espaço onde cabe (e deve caber) todo mundo”. Acredito também que a gestão da educação pública deve seguir essa premissa. Eu tive a sorte de fazer a transição para um terceiro setor que constrói à quatro mãos, que crê no protagonismo das redes públicas, no desenvolvimento humano de todos os envolvidos no processo, não somente das crianças e jovens pelos quais lutamos por uma educação melhor.
As experiências nas duas maiores redes públicas de educação me deram a visão da realidade dos governos, me fizeram conhecer a estrutura e as diferentes formas de operar as máquinas estaduais. Outro grande aprendizado, foi o de trabalhar em escala e descentralizadamente com as estruturas regionais. Também aprendi muito com a diferença geracional e a desconfiança com a gestão.
Hoje, utilizo todos esses conhecimentos para lidar de forma estratégica e empática com as redes públicas parceiras, no fazer e influir que o Instituto Ayrton Senna acredita. Além disso, fortaleço-me também pelo grande foco em gestão de pessoas, pela acolhida e cuidado com o nosso desenvolvimento, pela crença em práticas inovadoras de gestão e pela busca constante da coerência entre o que acreditamos e o que praticamos.
Há uma forte discussão em gestão pública sobre a necessidade de repensar o pacto federativo. Quem sabe isso não inclua a relação com o terceiro setor também? De toda forma, seguimos mudando o mundo em parceria, pois é possível e importante! E a experiência em um ou outro faz diferença para ambos também.
Maria Carolina Paseto é Líder MLG e trabalhou no Escritório de Prioridades Estratégicas do Governo de Minas Gerais com o tema Educação e também esteve na Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. Atualmente, Carolina é Gerente de Projetos Educacionais no Instituto Ayrton Senna.