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Racismo e Futebol: uma oportunidade para construção de políticas públicas antirracistas

Cercado de polêmicas e incertezas quanto ao conteúdo da prova do ENEM-2021, derivado do discurso do Presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que afirmou que as provas teriam “a cara” de seu governo, o assunto do racismo foi colocado em pauta, surpreendendo muita gente. No mês Novembro, em que comemoramos o Dia da Consciência Negra, os estudantes que concluíram o ensino médio se depararam com uma questão do ENEM que discutia o enfraquecimento do mito da democracia racial no futebol a partir da responsabilização do goleiro Barbosa, que era negro, pela derrota da seleção brasileira na final da Copa de 1950.

Questões como essa nos permitem concluir que desde a Copa do Mundo de 1950 não houve avanços suficientes para acabar com o racismo no Brasil, sobretudo no futebol, paixão nacional em que a principal figura de todos os tempos, Pelé, é um homem negro. Um paradoxo difícil de engolir. 

O caso mais recente de discriminação no futebol brasileiro é do jogador Celsinho, do Londrina. Após sofrer o terceiro caso de racismo durante uma partida contra o Brusque, na Série B do Campeonato Brasileiro, Celsinho veio à público e disse ter sido vítima de ataques racistas inclusive de pessoas que compunham o corpo técnico do time rival. 


Casos de racismo no futebol brasileiro

Embora tenhamos assistido cotidianamente casos semelhantes como o relatado, aos poucos dirigentes de clubes se mobilizam para modificar essa realidade. A decisão inédita de adicionar cláusulas antirracistas em contratos de funcionários e jogadores, por exemplo, foi tomada recentemente pelos seguintes clubes: Bahia, Bragantino, Ceará, Corinthians, Cuiabá, Internacional e Palmeiras. A pergunta que não quer calar é: As cláusulas vão ficar no papel ou vamos assistir a partir do ano que vem casos corriqueiros de punição às atitudes racistas? O fato é que os efeitos práticos dessas normas só poderão ser observados a médio prazo. 

Agora destacamos abaixo uma das falas de Celsinho que nos faz transpor a discussão do racismo dentro do ambiente esportivo para o dia-a-dia, dando sentido a elaboração deste artigo para o Blog da Rede de Líderes Públicos do MLG: 

“A pessoa quando é racista, criminosa, preconceituosa, isso está dentro dela. Em um momento ou outro, ela acaba cometendo esses atos horríveis contra outra pessoa. Não vejo isso só no futebol, mas sim na sociedade por inteiro.”


O papel das lideranças na construção de políticas públicas antirracistas

Parte dessa inquietação deriva de uma desconfiança em relação aos mecanismos jurídicos que balizam o tema do racismo no Brasil, pois ao infrator sempre haverá um arcabouço de medidas e recursos que tornam sua resolução tardia e facilmente revertida em penas menos severas. Já aqueles que sofrem ataques racistas tendem a perder força no discurso com o passar do tempo e quase sempre são classificados como “mimimi”, ou exagero. 

Por isso, enquanto lideranças públicas, acreditamos que nosso papel é buscar caminhos alternativos que nos permitam refletir e influenciar nosso entorno para resolução ou mitigação desse problema complexo. 

O ponto de chegada deve sempre perpassar pelas instituições públicas, não há outra alternativa democrática que não seja por intermédio de nossas instituições! Dito isso, precisamos pensar – de forma crítica – que tipo de medidas de curto, médio e longo prazos são necessárias para que casos como o do jogador Celsinho não sejam normalizados. De qualquer forma, assegurar a existência dos espaços e vozes daqueles que se sentirem discriminados é o mínimo a ser feito, cabendo aos tomadores de decisão (de diferentes esferas, inclusive a pública) a criação e manutenção desses espaços de escuta e denúncia. 

Além disso, garantir a presença de pessoas pretas em espaços de decisões que auxiliem na criação de políticas públicas voltadas à esta população é primordial, afinal, a diversidade racial traz pluralidade e consistência ao debate. Essa atitude já foi anteriormente abordada por membros da Rede Negritude Pública no artigo “6 atitudes para combater o racismo institucional no setor público”. Se você quiser se aprofundar mais sobre este ponto, não deixe de conferir o texto indicado. 


Por fim, debater o tema em todos os espaços possíveis, tornando a questão racial presente na sociedade para além do futebol e do dia da Consciência Negra é essencial para avançarmos no debate e na construção de políticas públicas antirracistas . Logo, talvez o esporte seja um espaço para implementarmos políticas públicas antirracistas, afinal, mais importante do que ganhar um campeonato seria um país em que não tivéssemos casos como o do Celsinho, e que vítimas de racismo como o goleiro Barbosa pudessem conviver em sociedade e não fossem temas de questões do ENEM. É necessário avançarmos para uma sociedade mais igualitária. Ponto final. 

Neste final de semana teremos diversas partidas de futebol em estádios por todo o país. Além disso, milhares de jovens participarão do segundo dia do ENEM. A questão é: Até quando ficaremos apenas discutindo o racismo nos estádios e nas provas? Convidamos os líderes públicos a pensarem conosco sobre ações concretas para o enfrentamento do racismo no Brasil. Na Rede MLG, o grupo Negritude Pública discute essa temática mensalmente. Caso tenha se interessado, junte-se a nós!

Racismo, futebol e a construção de políticas públicas antirracistas

Bráulio Humberto é mineiro, administrador público, atuou como Diretor de Fomento e Organização de Políticas Esportivas na Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social de Minas Gerais por 3 anos, é Master em Liderança e Gestão Pública – turma 7 do CLP e membro da Rede Negritude Pública.

Marcelo Menezes é graduado em Políticas Públicas e em Ciências e Humanidades pela Universidade Federal do ABC (UFABC). Atuou como Coordenador de Projetos Sociais no Terceiro Setor, e atualmente é Analista de Implementação no Itaú Educação e Trabalho, é Líder MLG (Turma 7) e membro da Rede Negritude Pública.

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