O atual Governo assumiu uma postura reformista em sua breve estadia no poder, mesmo que isso significasse lidar com a impopularidade. A Reforma Política quase trouxe uma mudança radical do sistema eleitoral de proporcional para o “Distritão”, o que foi fortemente atacado pela opinião pública e refletiu em resistência no Congresso Nacional. O mesmo não se pode dizer da Reforma Trabalhista, que obteve êxito na aprovação, uma vitória de Temer em seu Presidencialismo de coalizão.
Todavia, essa conquista teve seu custo, que reflete na atual empreitada governista. No final de 2016, o Planalto apresentou à Câmara dos Deputados uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que propõe reformas ao atual Sistema Previdenciário. A PEC 287/2016 (ou Reforma da Previdência, como é conhecida) veio em um momento em que foi anunciado um rombo em 2016 de R$ 77,2 bilhões no sistema de servidores federais (982 mil beneficiários) e de R$ 149,7 bilhões no sistema geral do INSS (27 milhões de beneficiários).
Além do argumento do rombo exponencial (recentemente, a Secretaria da Previdência divulgou que o déficit do INSS aumentou em 18,3% em 2017 e o do sistema dos servidores federais em 11,9%), destaca-se a disparidade de benefícios concedidos entre os dois tipos de regimes. A conclusão da proposta é que se mudanças profundas nas regras de concessão de aposentadoria não ocorrerem, em breve o Estado não mais disporá de recursos suficientes para arcar com as mesmas, além de afetar investimentos em áreas básicas como Educação, Saúde e Segurança.
Entretanto, desde o início a PEC enfrentou obstáculos. A proposta afetaria setores específicos, como o de portadores de deficiência e idosos incapazes de prover sustento próprio – recipientes do Benefício de Prestação Continuada (BPC) – além de beneficiários da aposentadoria rural. Esses grupos possuem representação parlamentar forte, o que significou uma relevante oposição, mesmo dentro da base governista.
Apesar desses pontos de embate, o Governo conseguia trabalhar bem o aumento dos níveis de aprovação e de apoio dentro e fora do Congresso Nacional à sua proposta, mas viu seus esforços frustrados quando em maio foi apresentada a denúncia pelo Ministério Público Federal ao Presidente Michel Temer. Tal fato desencadeou uma evasão de partidos importantes da base governista, o que enfraqueceu ainda mais as chances de aprovação da Reforma, ao passo que o discurso da oposição se fortaleceu.
Esta, por sua vez, conduziu uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o tema, que obteve fraca participação dos parlamentares favoráveis à Reforma e do próprio Governo, o que culminou em um relatório que rejeitava a hipótese de um rombo do sistema previdenciário.
Neste meio tempo, o Planalto e sua base na Câmara focaram suas energias na derrubada das duas denúncias ao Presidente, a segunda tendo vindo em setembro. Quando enfim obtiveram êxito e um aparente ponto final com a saída de Rodrigo Janot como Procurador Geral da República, se depararam com uma PEC de popularidade baixíssima e uma Câmara dos Deputados temerosa frente ao custo político de sua aprovação.
As lideranças do Governo na casa retomaram o trabalho de fortalecimento do tema, conduzindo articulações e cobranças de apoio de partidos da base para que fechassem uma orientação única de voto aos parlamentares das legendas. Ao mesmo tempo, o Planalto avaliou que uma revisão à PEC seria cabível, articulando com o Relator da mesma, Deputado Arthur de Oliveira Maia, a proposição de uma emenda aglutinativa “enxugando” a Reforma.
Essa emenda excluiria as alterações ao BPC e ao regime dos trabalhadores rurais, visando angariar apoio de parlamentares ligados aos direitos dos portadores de deficiência e da bancada ruralista. Ainda, a proposta reformulada seria focada em três pontos básicos:
1) O aumento da idade mínima de aposentadoria (65 anos para homens e 62 para mulheres);
2) A equiparação de regras entre regimes geral e de servidores federais;
3) O estabelecimento de um período de transição de 20 anos para a vigência total de tais mudanças.
Um plano de comunicação mais estruturado e focado nesses pontos acima começou a se efetivar, recebendo eco das classes produtivas que também veicularam campanhas na mídia em apoio à Reforma. Em contraponto, a oposição fez ações online e offline em repúdio à proposta, o que contribuiu para agravar o clima de indecisão na Câmara dos Deputados. Todo esse contexto culminou no adiamento da votação da PEC para fevereiro de 2018, com data já determinada pelo Presidente Rodrigo Maia para dia 19.
Durante o recesso parlamentar e até que o Congresso Nacional retome essa discussão, o foco das forças governistas está em mapear os votos e convencer indecisos/contrários da base, sendo necessários 308 para a aprovação na Câmara. O Governo se mostra otimista em suas contagens e confia que as costuras políticas que têm sido feitas por Temer desde o final do ano passado serão cruciais para o sucesso da causa.
Daqui para frente, o que de fato vai determinar as chances de aprovação da proposta agora, que ainda precisa passar por dois turnos na Câmara e posteriormente no Senado Federal, é o tom de discussão do tema na retomada do ano legislativo, além das vozes da sociedade civil vindas das bases eleitorais, visto que grande parte dos parlamentares visa as eleições de outubro.
* Carolina Figueiredo é formada em Direito pela Universidade Federal de Goiás, atualmente trabalha no CLP na equipe de Mobilização que atua na construção e articulação de soluções que auxiliem líderes públicos na priorização de agendas estruturais do país.