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Os desafios de gestão nos municípios – Entrevista com Fábio Ferraz

O CLP conversou com Fábio Ferraz, Secretário Municipal de Saúde de Santos e Líder MLG, para discutir os desafios de gestão nos municípios, especialmente na área de saúde. Para ele, modernização e aperfeiçoamento das metodologias e parcerias público-privadas podem ser a saída para os gestores em época de escassez de recursos.

É claro que temos questões relacionadas ao subfinanciamento para diversas políticas públicas, mas, de qualquer forma, os municípios têm a oportunidade de melhorar suas metodologias de gestão.”

Quais os principais desafios para a gestão dos municípios no Brasil atualmente?

Eu tive a experiência de trabalhar nas áreas de educação, gestão e saúde. Cada uma tem as suas peculiaridades mas, de forma geral, há uma grande necessidade de aprimoramento das metodologias de gestão das diversas políticas públicas municipais. É claro que temos questões relacionadas ao subfinanciamento para diversas políticas públicas, mas, de qualquer forma, os municípios têm a oportunidade de melhorar suas metodologias de gestão. Precisamos ainda discutir sobre a forma de contratação de pessoas — a gente tem a participação dos funcionários públicos de carreira, o que é importante para a implantação de políticas de continuidade, mas também precisamos buscar novos modelos de gestão, como as organizações sociais (OSs) e outras parcerias público-privadas.

Como a modernização e aplicação de tecnologias da informação podem auxiliar na busca pela eficiência da estrutura pública?

Aqui em Santos tivemos uma oportunidade de criar um programa, que é uma experiência inédita, de processos digitais. Iniciamos essa implantação em 2015 e, em cerca de dois anos, já conseguimos implantar esse programa em 70% dos processos. No modo tradicional temos um documento no papel, onde alguém escreve suas considerações, carimba e manda para o próximo, sem uma definição de fluxo de sistema, fazendo com que todo o processo demore mais. Ao tornar os processos totalmente digitais, conseguimos definir melhor o fluxo, com um ciclo de resposta menor. Assim, na prática, conseguimos diminuir o tempo de resposta em diversos assuntos, tanto do ponto de vista interno, como no atendimento aos munícipes.

Alguns processos que no período anterior tramitavam em 60 dias, por exemplo, agora conseguem tramitar em cinco. Além dessa redução muito significativa de tempo, também estamos economizando insumos. Para se ter uma ideia, a gente gastava cerca de 500 mil reais por ano só em papel, e esse custo não existe mais. Esse é um exemplo de desburocratização da máquina pública que gera impacto direto para os munícipes de uma cidade.

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Quando falamos de saúde pública, quais os principais desafios?

Vivemos um momento de escassez de recursos e isso é um fato. Soma-se a isso uma peculiaridade de Santos, que é a cidade pólo da baixada santista. Isso faz com que  os serviços públicos da área de saúde sejam centralizados aqui, o que sobrecarrega o nosso serviço com o mesmo nível de custeio. Mas, de forma geral, precisamos também melhorar as metodologias de gestão na área da saúde pública porque ainda temos mecanismos um pouco engessados. Também ainda contamos, embora com bastante dedicação da maior parte dos colaboradores, com estruturas de contratação de RH um pouco arcaicas, com dificuldade de maximizar a contribuição dessas pessoas na administração pública.

Como Santos tem procurando enfrentar esses problemas?

Uma saída, que eu acredito ser bastante exitosa, é a particularidade das OS. Aqui em Santos a gente já conta com gestão compartilhada em algumas unidades hospitalares. Isso é novo, começamos em 2016, mas já temos resultados extremamente favoráveis. O Instituto Social Hospital Alemão Oswaldo Cruz, por exemplo, faz com que essa unidade hospitalar tenha uma performance realmente diferenciada. É uma organização social, que tem autonomia e faz a gestão do hospital de forma compartilhada, se afastando do modelo clássico de administração direta. Nesse hospital, onde a gente tem uma OS trabalhando de forma séria, com controle e transparência, temos indicadores de performance qualitativos e quantitativos, de um hospital que atende 100% SUS, com padrão de qualidade comparado aos bons hospitais da iniciativa privada, com o Albert Einstein, em São Paulo.

Como funciona na prática a gestão compartilhada?

Eu tenho um equipamento público, um hospital municipal, por exemplo. Ou eu posso colocar os profissionais na administração direta, que é o método tradicional, comprando todos os insumos e equipamentos por processo licitatório. Ou eu posso contratar uma OS. Um exemplo prático da diferença é quando um equipamento como um Raio X quebra. Isso é algo que acontece invariavelmente, tanto no público quanto no privado, porque esses equipamentos quebram mesmo. A diferença é a forma de resolver. No privado eles conseguem comprar outro ou chamar um técnico rapidamente. No público temos dificuldade porque os processos fazem com que a manutenção leve tempo até que aquele equipamento seja devolvido à população. Com a OS eu faço um contrato através de um chamamento público, as instituições que têm interesse em colaborar concorrem, e a escolhida faz um contrato de gestão com a Secretaria de Saúde, onde são estipuladas metas objetivas para serem cumpridas. Essa organização social é remunerada através do cumprimento de metas e assim conseguimos uma performance muito melhor. A organização social também tem maior flexibilidade, tanto para a contratação de profissionais pelo regime celetista, tanto para a aquisição de insumos e investimentos em geral.

Estas seriam saídas para minimizar os impactos para a população?

Sim, mas para minimizar, não para resolver. De fato a área da saúde tem necessidade sim de um maior volume de recursos. Mas o que acontece é que os gestores de saúde tradicionais costumam atribuir única e exclusivamente os problemas à falta de financiamento e isso não é verdade. Nós também temos a oportunidade de aprimoramento pela gestão. Por exemplo, aqui em Santos, nós da Secretaria de Saúde lideramos, há mais ou menos um ano e meio, uma verticalizada importante de informatização. Hoje 86% dos equipamentos da saúde já estão totalmente informatizados, com pelo menos um computador em cada consultório, farmácia e sala de vacina. Com isso, agora eu consigo começar a ter uma noção mais clara de controle de gastos, de agendas e de produtividade dos profissionais. São métodos que podem e estão colaborando muito para aprimorar a saúde. Faltam recursos? Sim. Mas, mesmo assim, dá para melhorar muito.

Fábio Ferraz é Advogado, Líder MLG e Mestre em Gestão de Políticas Públicas pela FGV/SP. É Secretário Municipal de Saúde de Santos. Foi Secretário de Gestão de Santos, Diretor de Habitação da COHAB-ST, Chefe de Gabinete na Assembleia Legislativa de São Paulo e exerceu a advocacia nas áreas previdenciária e trabalhista.

 

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