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Pacto Federativo: A divisão de responsabilidades na gestão pública

O Brasil possui uma infinidade de responsabilidades que muitas vezes precisam ser desempenhadas em conjunto com municípios, estados e com o governo federal, seja de maneira exclusiva, complementar ou concorrente. Bom, mas como saber o que é responsabilidade de cada ente? A resposta é o Pacto Federativo.

Cada nível de governo (municipal, estadual e federal) possui um conjunto de responsabilidades. Mas a pergunta que fica é: para quem devo reclamar? Para a prefeitura? Para o governo estadual? Ou para o governo federal? A manutenção das ruas locais, por exemplo, é uma atribuição municipal. Já o comando da Polícia Militar, é de responsabilidade estadual. E o fechamento de fronteiras, por exemplo, é uma responsabilidade federal.


O que é o Pacto Federativo?

O Pacto Federativo consiste em um conjunto de regras criadas para dividir as competências e organizar o funcionamento do Estado brasileiro*. Os artigos 21, 22, 23 e 24 da Constituição Federal Brasileira dispõe de maneira detalhada sobre essa divisão, destacando as responsabilidades de cada um dos entes. É a partir desse conjunto de orientações que as prefeituras, governos estaduais e o governo federal estruturam e organizam sua atuação.

Nem sempre, todavia, essa divisão é simples. No caso da educação, por exemplo, cada ente tem um papel específico: os municípios ficam com a responsabilidade preferencial sobre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental 1, os governos estaduais sobre o Ensino Fundamental 2 e o Ensino Médio, enquanto a União se encarrega de coordenar financeira e tecnicamente o sistema, além de gerir as Universidades Federais. No caso da saúde, também há uma importante divisão de competências. O governo federal se encarrega majoritariamente das funções relacionadas ao planejamento, formulação das políticas e controle das ações, enquanto os governos estaduais complementam as ações federais apoiando e coordenando a descentralização e os municípios são quem efetivamente prestam os serviços de saúde para a população.

Diante dessas múltiplas competências e responsabilidades distribuídas e compartilhadas entre os entes, como visto nos casos da saúde e da educação, é comum que surjam conflitos. Um notório caso que envolve profundas disputas federalistas na prestação do serviço é o saneamento básico. Em princípio, a responsabilidade pela operação das redes de distribuição de água e coleta/tratamento de esgoto é municipal. Todavia, historicamente os governos estaduais desempenharam um forte papel de protagonistas desse serviço, em especial por meio das CESBs, as Companhias Estaduais de Saneamento Básico. Em função disso, muito se discute sobre quem é efetivamente o ente responsável nesse segmento, em especial tendo em vista que a legislação abre espaço para interpretações. 

Leia também: Um panorama do saneamento básico em 5 pontos


E como são resolvidos os conflitos federativos entre municípios, estados e a União?

É aqui que entra o papel do Supremo Tribunal Federal (STF). A mais alta corte jurídica do país, existente desde 1891, o STF é responsável fundamentalmente pela proteção à Constituição Federal, garantindo que os demais poderes respeitem as regras constituintes. Fica, portanto, sob responsabilidade do STF, o julgamento dos conflitos federativos entre municípios, estados e a União. Além do caso do saneamento básico, sobre o qual o tribunal já emitiu diversos pareceres, um notório caso chamou a atenção da população nos últimos anos: as responsabilidades diante das medidas de enfrentamento da pandemia do Covid-19. A disputa em especial entre os governadores e o presidente da República, que não compartilhavam da mesma estratégia para enfrentamento da doença no país, culminou na decisão em favor dos entes subnacionais que passaram a contar com poder para determinar regras de isolamento e quarentena relacionadas à crise sanitária.


Como o Pacto Federativo foi definido?

A história do Pacto Federativo brasileiro é longa, tendo início em 1889, quando o Brasil deixou de ser uma monarquia para se tornar uma república. De então para hoje, mais de cinco diferentes constituições foram promulgadas, cada uma alterando e reconfigurando as regras do funcionamento do Estado brasileiro de acordo com particularidades históricas e políticas de cada momento.

A história recente do atual conjunto de regras federativas, todavia, tem início com o fim do regime militar. Como forma de se distanciar do passado ditatorial, maiores responsabilidades para a execução das políticas públicas foram repassadas aos entes subnacionais, ou seja, os governos estaduais e, em especial, municípios. Esse processo ficou conhecido como descentralização, e o argumento por trás foi de que quanto mais próximo da população os serviços públicos fossem prestados, maior seria o grau de democratização. Assim, a Constituição de 1988, colocou os municípios em um papel de destaque no Pacto Federativo, caracterizando-os como protagonistas do novo funcionamento federalista do país.


Como funciona o Pacto Federativo em outros países?

Cada país pode conter seu próprio conjunto de regras sobre a definição de responsabilidades públicas. Porém, um importante ponto a se destacar aqui é que nem todos os países contam com um pacto federativo. E isso ocorre por um simples motivo: nem todos os países são federações. Existem países unitários, como é o caso do Chile, de Portugal e da Suécia.


O que define um país federalista?

A resposta para essa pergunta não é tão simples. Existe, todavia, um conjunto de características que costumam estar presentes nos países federalistas. São elas:

  • Dois ou mais entes independentes: diferentemente dos países unitários, onde os governos regionais estão subordinados ao governo central, nas federações existe ao menos um nível de governo com autonomia em relação ao governo central. No caso do Brasil, por exemplo, tanto os governos estaduais, quanto os municipais, são autônomos com relação à União. Em outras palavras, os governadores e prefeitos não obedecem ao presidente da república.
  • Constituição escrita: a existência de uma carta constituinte formal e escrita é elemento importante na definição de uma federação. Além disso, é preciso que existam partes que não possam ser alteradas pelo governo federal, como no caso do Brasil, as cláusulas pétreas.
  • Câmaras altas: é frequente a existência de instâncias de representação dos entes subnacionais no legislativo federal. No Brasil temos o Senado, que representa cada estado da federação igualmente, independentemente de sua população. Isso garante a participação efetiva de regiões menos populosas na política nacional.
  • Procedimentos de decisão: países federalistas costumam contar com processos bem definidos quanto à resolução de conflitos federativos, muitas vezes envolvendo instituições ou tribunais específicos. No caso brasileiro, estes procedimentos são descritos na Constituição, e cabe ao STF realizar os julgamentos com relação aos conflitos federativos.

Mas mesmo dentro dos países federalistas, ainda existem significativas diferenças. Seja com relação ao processo de formação da federação – que pode ser a unificação de estados antes dissolvidos, como no caso dos EUA e da Alemanha, ou a segmentação de um país antes unitário, como o caso do Brasil, seja com relação ao grau de autonomia dos entes subnacionais, seja com relação aos procedimentos para resolução de conflitos federativos. 

Nem todos os países existentes são federações. Porém, aqueles que são, precisam contar com um conjunto de regras e procedimentos que definem e organizam o funcionamento do Estado, conjunto este denominado Pacto Federativo. A partir dessas definições, os governos poderão estruturar sua atuação para conduzir suas atividades em prol de seus objetivos: a prestação de serviços públicos de qualidade, a construção de uma sociedade próspera e justa e a geração de valor público.

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