Este conteúdo explora mais um dos problemas comuns de grande parte das prefeituras pelo país: o orçamento limitado e a demanda por serviços públicos de qualidade. Conheça algumas ações que podem auxiliar na arrecadação municipal e exemplos de municípios que estão contornando este desafio com iniciativas como rever gastos, promover parcerias, e outras ações.
O Cenário dos Municípios
Crise Financeira e Dependência de recursos
A crise financeira, que atinge todo o país desde 2015, impactou na diminuição nos repasses de verbas feitos aos municípios. Dessa forma, muitas cidades brasileiras que dependem desses recursos vem sofrendo com a diminuição de suas receitas.
Um estudo da Federação das Indústrias do Estado do Rio (Firjan) mostrou que mais de 5 mil municípios brasileiros têm nas transferências, estaduais e federais, pelo menos 70% de suas receitas correntes. Ou seja, a maior parte dos recursos municipais são oriundos dos repasses.
Ao mesmo tempo, as prefeituras são as maiores empregadoras do país com 6,3 milhões de funcionários. E mesmo com a crise, as cidades aumentaram em mais de 50% o total de funcionários — enquanto a população cresceu apenas 12%.
O Crescimento da Folha de Pagamento
Com o aumento de funcionários, a folha de pagamento, ou seja, o gasto dos governos com pessoal, também aumentou. O problema é que, de modo geral, a receita dos municípios tem diminuído.
Além do cenário de crise, a distribuição dos repasses é feita de forma desigual, pois a conta é relacionada à arrecadação das cidades. Dessa forma, muitas vezes, os municípios que mais precisam de recursos, pois não têm uma economia local forte, são os que menos recebem verbas.
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A Ausência de Processos Eficientes
Para Elisa Krumholz Adler, economista, mestre em políticas públicas e líder MLG, o que agrava o desafio é que a maioria dos governos não possuem o hábito de rever as inconsistências e variações do ano anterior. Elementos necessários para fazer reajustes no processo de construção de suas leis orçamentárias.
Elisa também aponta que os processos de arrecadação própria são ultrapassados e ineficientes, especialmente porque muitos municípios ainda não se atualizaram e não investem em tecnologia.
Além disso, no contexto de crise, a demanda por serviços públicos aumenta, especialmente nas áreas de saúde e educação. Sem dinheiro, muita gente para de pagar plano de saúde ou escola particular, por exemplo.
O que pode ser feito?
O desafio orçamentário dos municípios pode ser dividido em duas áreas:
• Receita/Arrecadação;
• Custo e Pessoal.
Levando em conta essas lógicas, algumas sugestões são:
Do ponto de vista da Receita/Arrecadação:
• Rever a qualidade dos gastos públicos municipais e elencar melhor as prioridades;
• Investir em tecnologia;
• Fortalecer a receita própria;
• Apostar em parcerias como consórcios, associações municipais e compras conjuntas;
Do ponto de vista de Custo e Pessoal:
• Investir na capacidade institucional, qualificando os recursos humanos;
• Investir no aprimoramento da eficiência de áreas setoriais estratégicas como Gestão de Contratos.
>> O Conexão Pública é um exemplo de programa de capacitação para equipes municipais
Abaixo, contamos as opiniões de pessoas que lidam na prática com este desafio e pensam em ações para para aplicá-las em seus municípios.
Como melhorar a qualidade do gasto público?
Investir em Planejamento Estratégico
Para Teresa Fernandes, Assessora Técnica da Secretaria Municipal de Planejamento, Finanças e Orçamento de Curitiba e Líder MLG, é preciso “dançar conforme a música” para tentar melhorar o serviço.
“Quando existe um planejamento estratégico bem elaborado, as coisas não caminham desorganizadas porque os gestores conseguem definir melhor o que é prioridade, o que precisa ser feito naquele momento. Já quando esse planejamento não existe, é comum que as coisas se percam.”
Apostar no Alinhamento
Teresa explica que a alta gerência tem que patrocinar esse planejamento estratégico, ou seja, a organização deve começar de cima. Para a líder MLG, o alinhamento entre as secretarias é muito importante para que o governo não gaste com o que não deve. “Todo mundo acha o planejamento algo chato, mas é necessário.”
>> Leia mais sobre como Melhorar a Comunicação entre Secretarias
Promover Parcerias
As parcerias, consórcios e associações acabam sendo, especialmente para os municípios menores, muito importantes para que eles consigam se sustentar. Os gestores também podem contar com a ajuda de ONGs para gerir o recurso, evitando desperdícios.
Outra oportunidade pode ser buscar parcerias também com as principais empresas da cidade. Elas podem apoiar alguns projetos para viabilizá-los, num modelo como crowdfunding. Há ainda a possibilidade, especialmente para municípios com amplas áreas rurais, de investir em mecanismos de desenvolvimento sustentável, como venda de crédito de carbono. O projeto Projeto NovaGerar (Nova Iguaçu – RJ) e o Projeto Plantar (Minas Gerais) são alguns exemplos.
Exemplos de boas práticas em gestão orçamentária
Veja o que algumas cidades estão fazendo para driblar a crise e oferecer bons serviços à população:
O exemplo de Iracemápolis (SP)
A cidade do interior de São Paulo é um exemplo. Com controle de gastos, a Prefeitura de Iracemápolis conseguiu atingir a marca de R$ 1 milhão de economia e fechar o ano passado em superávit, mesmo no cenário de crise nacional.
Entre as medidas recentes, estão:
• Troca do sistema de telefonia por pacotes de melhor custo x benefício;
• Instalação de GPS em carros públicos para monitoramento de custo;
• Redução de gastos com energia elétrica, aluguel, combustível e hora-extra. Saiba mais.
O exemplo de Juiz de Fora (MG)
Uma prática que tem dado certo em Juiz de Fora (MG) é a criação de um comitê orçamentário e financeiro que estuda onde podem ser feitos ajustes para diminuir os gastos sem diminuir a qualidade do serviço.
Fúlvio Albertoni, Secretário de Finanças de Juiz de Fora e Líder MLG, conta que, a partir do comitê, o município verificou as despesas que não podem ser reduzidas de imediato, como pagamentos, impostos e merenda escolar. Esses itens foram priorizados no planejamento financeiro. Entretanto, há áreas onde é possível fazer cortes, como viagens, patrocínios e festividades.
Além disso, o município também investiu em ações como:
• Reformulação da Folha: o tamanho da prefeitura foi repensado e pastas foram fundidas a fim de diminuir gastos.
• Diminuição de Comissionados: o número de comissionados também foi reduzido em 20%. “Conseguimos economizar fazendo uma redistribuição do processo de trabalho e não houve perda de qualidade.”
• Promoção de Parcerias: um exemplo de parceria foi a implementação do serviço de SAMU. As cidades menores que não podem ter um serviço exclusivo colaboram financeiramente com o SAMU de Juiz de Fora e, em troca, podem utilizar o serviço. “Dá para melhorar o serviço barateando o custo.”
Ações para oferecer bons serviços à população
Como vimos, o orçamento limitado é uma realidade da grande parte dos municípios brasileiros.
A crise financeira nacional, a dependência dos repasses federais e a folha de pessoal no limite compõem o desafio de gestores na gestão pública municipal.
Especialistas em políticas públicas municipais contaram sobre ações que podem auxiliar nesse processo, como a revisão da qualidade do gasto, o investimento em tecnologia, e a necessidade do planejamento estratégico.
Ao mesmo tempo, municípios como Iracemápolis (SP) e Juiz de Fora (MG) provam que, mesmo em um cenário difícil, é possível desenvolver ações de gestão orçamentária que trazem qualidade e melhorias na entrega dos serviços públicos à população.
*Contribuíram com esse artigo: José Henrique Nascimento, responsável por Novos Negócios do CLP; e os líderes MLG, Teresa de Fátima Fernandes, Assessora Técnica da Secretaria Municipal de Planejamento, Finanças e Orçamento de Curitiba; Fúlvio Piccinini Albertoni, Secretário de Finanças de Juiz de Fora e líder MLG; e Elisa Krumholz Adler, especialista em políticas públicas do legislativo do Rio de Janeiro.